Valor Econômico, v. 20, n. 4975, 04/04/2020. Especial, p. A14

Para analistas, projeção de déficit está subestimada

Fabio Graner 


A projeção de déficit primário de R$ 419 bilhões para 2020 anunciada na semana passada pelo secretário-especial de Fazenda, Waldery Rodrigues está subestimada, apontam economistas ouvidos pelo Valor. A principal razão é que o cálculo apresentado em anúncio-surpresa no Palácio do Planalto considera uma estimativa de crescimento zero para o PIB, enquanto o mercado já trabalha com números de queda na economia.

Vale lembrar que o próprio governo já admitiu que suas projeções de PIB estão defasadas. Na sexta-feira, o Valor noticiou que o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, apresentou ao TCU cenários de queda de até 5,5% do PIB brasileiro neste ano.

Para o especialista em contas públicas Guilherme Tinoco, o desempenho do PIB neste ano deve tirar de R$ 30 a R$ 40 bilhões das receitas atualmente projetadas pela União, podendo ser ainda bem maior que isso considerando outros efeitos, como problemas de fluxo de caixa das empresas.

Ele lembra que a pesquisa Focus já aponta queda de 0,5% para o PIB neste ano, mas algumas das mais renomadas instituições do mercado apontam já queda de 3% para a atividade econômica.

Tinoco ainda comenta que não se pode descartar a necessidade de o governo ampliar ainda mais seus gastos. “Ninguém sabe extensão da crise, para esse auxílio emergencial ter que escorregar mais um mês, não precisa muito”, comentou. “O déficit pode chegar a R$ 500 bilhões neste ano”, afirmou.

O economista ainda ressalta que os Estados devem ter uma brutal queda de receita, o que piora o cenário das contas públicas de forma geral.

A pesquisadora do Ibre/FGV e também especialista em contas públicas Vilma Pinto concorda que o cenário de déficit  apresentado por Waldery está subestimado. Além do governo estar trabalhando com um PIB muito mais otimista que o mercado, ela ressalta que essa situação é diferente de outros momentos de recessão porque está havendo uma paralisação massiva de atividades, não uma redução tradicional de produção.

Para ela, esse quadro não só implica queda de arrecadação, devido ao PIB menor, mas também porque é provável um cenário de grande inadimplência dos contribuintes. “Há o diferimento de impostos, mas é bem possível que se tenha inadimplência da parte não diferida”, lembrou.

Segundo Vilma, mesmo após o fim da paralisação ainda deve haver um quadro recessivo em que muitas empresas não conseguirão voltar ou reduzirão suas capacidades produtivas, bem como ampliação das demissões.