Correio Braziliense, n. 21852, 14/01/2023. Política, p. 4
Militares teriam auxiliado na fuga de golpistas
Henrique Lessa
Extremistas bolsonaristas afirmaram em grupos de mensagem que militares avisaram a hora em que eles deveriam deixar o acampamento em frente ao QG do Exército para evitar a prisão pela Polícia Militar, após os ataques terroristas de domingo.
Em áudio atribuído a uma das líderes golpistas, identificada como Ana Priscila Azevedo — vista em vídeos no ataque ao prédio do Supremo Tribunal Federal (STF) —, ela alerta os seguidores a não criticar o Exército, diz que deve aos militares a sua fuga de Brasília. Ana Priscila seria a criadora de um grupo no Telegram chamado “Queda da Babilônia”, que reúne mais de 50 mil participantes.
No áudio enviado no meio da manhã do dia seguinte aos ataques, ela afirma que está em casa graças aos militares, “A gente foi para o enfrentamento lá, depois não dava para ir para o hotel, o único lugar seguro era o QG”, conta. “Não fale do Exército, vocês não viveram o que a gente viveu. Se não fosse o Exército, eu não sei o que seria do povo”, acrescenta, na mensagem.
Segundo ela, militares permitiram o refúgio após a ação da polícia, que foi impedida de prosseguir dentro do Setor Militar Urbano (SMU). No dia seguinte, integrantes da Força teriam evitado a prisão de muitos criminosos. “O Exército deixou a gente ficar lá, depois o Exército avisou a hora da gente sair. A maioria que foi preso é porque foi teimoso, porque esperou, porque não acatou a ordem do Exército, quando falou: ‘Sai, vai embora, agora é hora, eles não estão aqui, depois, as seis da manhã, vai fechar tudo’, foi o Exército que avisou a gente”, relata.
Ana Priscila só foi presa no final do dia seguinte aos ataques, em Luziânia (GO), a cerca de 60km da capital federal.
Relato
O relato sobre a atuação do Exército é confirmado por participantes de outros grupos. Em uma dessas mensagens, postada cerca de 7h no grupo “Mentes sobreviventes”, uma mulher não identificada descreve um comportamento semelhante de supostos militares, nos quais ela diz não ter acreditado.
“Eles chegaram agora, antes da seis da manhã. Vieram cinco homens à paisana aqui, foram de barraca em barraca, dizendo que era para a gente sair daqui, que, lá fora, teria seis ônibus esperando para nos levar embora. Eles me disseram que estavam à paisana para não causar tumulto, mas disseram que são militares. A gente não acreditou, aí e eu fui perguntar para um dos soldados fardados, um dos que estavam enfileirados, e ele falou ‘não procede, descarta, não chegou nada para gente disso’, inventaram que tinham um decreto que podiam entrar aqui dentro”, frisa. “Teve muita gente que acreditou, mas isso é ratoeira. Lá fora, eles vão ser presos, porque vão sair da área de proteção. Mas eles não enxergam, a gente está tentando fazer os patriotas enxergarem que isso é uma armadilha, o Exército está do nosso lado”, completa.
No local, segundo estimativas das autoridades, cerca duas mil pessoas estavam na frente do QG do Exército. Com a chegada de mais 100 ônibus a Brasília, cerca de três mil golpistas se juntaram aos acampados. Apesar de grande parte ter buscado refúgio no acampamento após os ataques, apenas 1.500 pessoas foram aprendidas na manhã de segunda-feira.
A operação de cercamento e desmobilização do acampamento foi iniciada às 8h do dia seguinte aos ataques. Durante a madrugada, o SMU não ficou cercado pela polícia. Questionada pelo Correio, a assessoria do Exército Brasileiro não respondeu até o fechamento da reportagem.