O Globo, n. 32519, 19/08/2022. Política, p. 7
Provocado, Bolsonaro avança contra youtuber
Daniel Gullino
Paula Ferreira
O presidente Jair Bolsonaro se envolveu na manhã de ontem em uma confusão ao agarrar a camisa e tentar tirar o celular de um youtuber após ser provocado durante conversa com apoiadores, ao deixar o Palácio da Alvorada, em Brasília. Wilker Leão, que tem um canal na internet, chamava o presidente de “tchutchuca do Centrão” e questionava medidas tomadas por Bolsonaro, quando foi confrontado pelo presidente. O vídeo da confusão foi publicado pelo g1.
Antes do embate com Bolsonaro, Wilker já havia sido derrubado no chã opor apoiadores do presidente. O influencer costuma ir à saída do Alvorada par agravar vídeos nos quais provoca Bolsonaro e militantes bolsonaristas. Em abril deste ano, Wilker já havia discutido com o presidente após questionar Bolsonaro sobre declarações a respeito da realidade de cabos e soldados do Exército nos quartéis.
No episódio de ontem, Bolsonaro cumprimentava apoiadores quando começou a ser questionado por Wilker:
— Por que o senhor limitou delação premiada, presidente? — perguntou, sendo empurrado em seguida.
Após aqueda,WilkerL eão perguntou a Bolsonaro o que ele achava desta violência e foi ignorado pelo presidente. O influencer, no entanto, continuou gritando:
— Quero ver se você é corajoso de sair para conversar comigo, tchutchuca do Centrão. O Lula é ladrão também, mas esse aí está fazendo tudo que o PT faz, senão o PT volta — disse Wilker Leão. — Seu covarde, tchutchuca do Centrão. Safado! Você é vagabundo.
Após as falas, o presidente saiu do carro e foi em direção a Wilker tentando tirar o celular da mão do influencer.
—Vem cá, quero falar contigo, vem cá—disse Bolsonaro ao puxar o youtuber pela camisa e segurar seu braço.
A campanha de Bolsonaro, conforme noticiou a colunista do GLOBO Malu Gaspar, avaliou reservadamente que, no episódio, houve uma falha de segurança do Gabinete de Segurança Institucional (GSI). Já aliados disseram que Bolsonaro teria errado ao reagir às provocações.
Leão ganhou seguidores nos últimos meses ao gravar vídeos fazendo perguntas incômodas tanto para apoiadores de Bolsonaro quanto para defensores do ex-presidente Lula (PT). Leão serviu ao Exército oito anos e chegou a ser punido por gravar vídeos comentando assuntos militares.
No início da tarde de ontem, Leão tinha 127 mil seguidores no TikTok, além de 16 mil inscritos em seu canal do YouTube e 10 mil seguidores no Instagram — parte deles conquistada nas últimas horas, após o episódio com Bolsonaro.
Leão criou seu canal no YouTube em março do ano passado, quando ainda era militar da ativa. O objetivo era tratar de assuntos da caserna, como documento de identificação militar, porte de arma para soldados e pensão militar, entre outros assuntos. A atitude, no entanto, rendeu três dias de detenção, como ele próprio narrou em um vídeo, por ter se manifestado sobre assuntos do Exército sem autorização.
O influencer chegou a entrar com mandado de segurança no Superior Tribunal de Justiça( STJ) solicitando que cabos e soldados tivessem acesso à carteira de identidade militar, mas o pedido foi negado. Em fevereiro, Leão publicou no Instagram que estava indo para a reserva do Exército:
“Em 8 anos de caserna, que vão se completando, foram inúmeros os serviços tirados, mas eis que o último chegou. Restam ainda mais alguns dias na ativa, mas o saudosismo e a nostalgia precoces já vão se instalando. Este é um momento em que, paradoxalmente, a alegria de não ter que passar mais pelas situações narradas se mistura coma tristeza de saber que não viverei essa experiência que agregou, na dificuldade, tanto na min havida ”.
A partir daí, começou uma nova fase: gravar vídeos interpelando petistas e bolsonaristas em locais públicos com perguntas incômodas. Apesar de fustigar os dois lados políticos, a maioria das gravações é de conversas com apoiadores do presidente no Palácio da Alvorada, assim como ele fez ontem. Segundos registros de Leão, ele já foi 55 vezes ao local.
Em abril deste ano, o youtuber conseguiu falar diretamente com Bolsonaro no “cercadinho”, como é conhecido o local. Na ocasião, questionou o presidente sobre o tratamento dado a soldados e cabos no Exército. O chefe do Executivo, no entanto, irritou-se com as perguntas.
Procurado, o Exército informou: “O senhor Wilker Leão de Sá não integra atualmente os quadros do Exército Brasileiro. O cidadão em tela foi militar temporário, tendo sido incorporado às fileiras do Exército em 1º de março de 2014, para prestar o serviço militar obrigatório. Foi licenciado em 28 de fevereiro de 2022, na graduação de cabo, por ter atingido o tempo máximo de permanência”.