Valor Econômico, v. 20, n. 4976, 07/04/2020. Opinião, p. A12

Medidas não evitarão piora do mercado de trabalho


O mercado de trabalho entrou já muito fragilizado na pandemia do coronavírus. Apesar das diversas ações anunciadas pelo governo, tudo indica que o desemprego poderá ser ainda maior quando a crise finalmente passar. As medidas, que vão implicar desembolso equivalente a cerca de R$ 200 bilhões, apenas devem evitar que o pior aconteça. Além da demora na elaboração, elas estão demorando para serem implantadas. Em alguns casos, como o auxílio aos informais, nem se sabe bem como se chegará aos bolsos pretendidos.

Depois de dois trimestres de recuperação, os dados do mercado de trabalho levantados pela Pnad Contínua do IBGE voltaram atrás no período de dezembro a fevereiro. O índice de desemprego subiu 0,4 ponto na comparação com o trimestre anterior, findo em novembro de 2019, subindo de 11,2% para 11,6%. Em números, os desempregados somavam 12,3 milhões de pessoas no mês do Carnaval.

O desemprego geralmente aumenta em início de ano com a dispensa de trabalhadores do setor de varejo contratados para postos criados para atender o aumento da demanda tradicional de fim de ano. Desta vez, no entanto, chamou a atenção que as demissões foram lideradas pelo setor de construção, que não conseguiu manter a reação do fim de ano. Houve demissões também na administração pública, em boa parte de empregados na área da educação, muitos dos quais seriam contratados após a aprovação do novo orçamento, e nos serviços domésticos.

O número de trabalhadores ocupados, incluindo empregados, empregadores, funcionários públicos e os que trabalham por conta própria, diminuiu 0,7% para 93,7 milhões. Os trabalhadores informais representavam 40,6% do total de ocupados, um pouco menos do que os 41,1% do trimestre anterior, mas ainda assim envolvia 38 milhões de pessoas. Esse grupo compreende os sem carteira assinada, incluindo empregados domésticos, empregadores sem CNPJ e trabalhadores familiares auxiliares.

Na tentativa de amenizar o impacto da pandemia de coronavírus no mercado de trabalho, o governo lançou, até o momento, iniciativas em três frentes. Em um primeiro momento buscou minorar a situação crítica dos trabalhadores informais, os primeiros que sentiram o impacto do isolamento social imposto na tentativa de se desacelerar a escalada da contaminação da população. A renda dos informais cessou imediatamente. O governo criou um auxílio emergencial, inicialmente fixado em R$ 200, que a Câmara dos Deputados triplicou. O grupo beneficiado foi sendo ampliado. Ao final, além dos informais, foram abrangidos os autônomos, microempreendedores individuais (MEIs), os listados no Cadastro Único e beneficiários do Bolsa Família.

Cálculos feitos pela Fundação Getulio Vargas, quando se estimava que perto de 29 milhões de pessoas seriam beneficiadas, era que o custo da medida seria inferior a 1% do Produto Interno Bruto (PIB), mas seu impacto na economia seria maior, aumentando o PIB em 1,2%. Já a Instituição Fiscal Independente (IFI), que assessora o Senado, calculou que os beneficiados chegam a 30,5 milhões, ao custo de R$ 59,3 bilhões em três meses. Mas o governo fala em 54 milhões de pessoas e em um custo que chega a R$ 98 bilhões.

Outra medida foi a abertura da linha de crédito de R$ 40 bilhões para financiamento de folha de pagamento de pequenas e médias empresas por um período de dois meses. Estima-se que o valor é suficiente para beneficiar 1,4 milhão de empresas e 12,2 milhões de pessoas. O programa estabelece teto de dois salários mínimos por funcionário e proibição para demissão durante esse período. O valor a ser gasto, no entanto, é bem aquém do necessário uma vez que o total de pequenas e médias empresas é três vezes maior.

Na área trabalhista, o governo regulamentou a suspensão de contratos de trabalho, liberando a redução de jornada de trabalho e salários, com compensação parcial das perdas pelos cofres públicos. Embora a compensação possa ser quase integral para as faixas mais baixas de renda, pode haver perdas de rendimento sobretudo para as faixas salariais mais altas. O governo estima que a medida deverá envolver R$ 51,2 bilhões.

Todos esforços são válidos, mas não dispensam posterior revisão e até ampliação pois a necessidade é seguramente maior. Importante também será agilizar sua implementação dada a gravidade da situação. Mas o aumento do desemprego é dado como certo e já se prevê que a taxa pode superar 15%, ou 5 milhões a mais.