Correio Braziliense, n. 21860, 22/01/2023. Brasil, p. 6

Situação em Roraima é "desumana", diz Lula

Tainá Andrade


O presidente Luiz Inácio Lula da Silva esteve ontem em Roraima para verificar a situação do povo indígena ianomâmi que sofre com a insegurança alimentar e social, doenças infecciosas e altos índices de desnutrição. O presidente classificou o cenário como “desumano”.

Ao discursar na Casa de Saúde Indígena (Casai) Yanomami, na zona rural de Boa Vista, ao lado da comitiva de crise e da coordenadora da missão, a ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, anunciou uma série de medidas na saúde, no desenvolvimento social e na Justiça para reverter a situação, que tem origem direta no aumento do garimpo ilegal na região. “Tive acesso a umas fotos nesta semana. Efetivamente me abalaram porque a gente não pode entender como o país que tem as condições do Brasil deixar indígenas abandonados como estão aqui”, disse.

Durante a visita, o presidente priorizou as ações que deverão servir para diminuir a carência dos indígenas. Um hospital de campanha será montado pela Aeronáutica, na sexta-feira, em Boa Vista. A transferência da estrutura começou ontem. Lula também anunciou que ontem chegariam 200 latas de suplementos alimentar para crianças, de várias faixas etárias.

Para os produtos chegarem até o Distrito Sanitário Especial Indígena Leste (DSEI) Yanomami serão feitos cerca de 50 voos em aeronaves de pequeno porte, pois o aeroporto de Surucucu está em obras. Helicópteros auxiliarão na distribuição dos alimentos. No retorno à capital, os mesmos aviões ficarão responsáveis por trazer os indígenas que necessitam de atendimento médico com mais estrutura.

Após o discurso da comitiva, o ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Wellington Dias, se encontrou com o líder indígena Davi Kopenawa para definir o que será atendido em caráter de emergência. “A nossa prioridade é cuidar da saúde. A gente não tem médico, fica dois, três meses esperando atendimento”, disse o indígena.

Questões como a reestruturação do transporte no local e demandas na área da educação, como escolas mais próximas e apoio social à comunidade, também foram abordadas e terão soluções a médio prazo.

Saúde

A ministra da saúde, Nísia Trindade, que também esteve na viagem, ressaltou que a pasta “está determinada a resolver as emergências” e que a sociedade deve precisa ter consciência do que está ocorrendo em Roraima, por isso, a importância de modificar o status da situação para uma crise sanitária.

“No caso da saúde, nós definimos que essa situação é uma emergência sanitária de importância nacional semelhante a uma epidemia. É isso que precisa ficar claro. Mas a sociedade tem que estar consciente do que está acontecendo aqui”, esclareceu a ministra.

Além da força-tarefa que foi montada no ministério para realizar um diagnóstico da situação sanitária, foi enviada uma equipe de 13 agentes da Força Nacional do Sistema Único de Saúde (SUS) a Boa Vista, para operar no Hospital de Campanha. A Aeronáutica também mandará uma equipe multidisciplinar com oito profissionais para Surucucu, polo base onde a situação está mais grave.

A pasta também instalou o Centro de Operações de Emergências em Saúde Pública (COE-Yanomami), de responsabilidade da Secretaria de Saúde Indígena (Sesai), coordena as ações com todos os atores.

Garimpo

Em discurso, Lula prometeu que vai interromper o garimpo ilegal na região, que cresceu desenfreadamente no governo de Jair Bolsonaro (PL). “Eu posso dizer para você é que não vai mais existir garimpo ilegal. E eu sei da dificuldade de se tirar o garimpo ilegal, já se tentou outras vezes, mas eles voltam”, lembrou.

Em certo momento, o presidente criticou Bolsonaro pelo descaso com o povo indígena da região. “Se em vez de fazer tanta motociata, ele (Bolsonaro) tivesse vergonha na cara e viesse aqui uma vez, quem sabe o povo não estivesse tão abandonado”, alfinetou Lula.

Wellington Dias, que esteve presente na comitiva, disse que o fato de cerca de 570 ianomâmis, segundo dados divulgados pelo Ministério dos Povos Indígenas, terem morrido de fome ou desnutridos é uma “vergonha” e um “genocídio”. “Foram a indiferença e o descaso do governo Bolsonaro que mataram o povo Yanomami. Agora chegamos para dar as mãos e trabalhar muito para estancar as mortes. Há muitos em situação crítica”, afirmou.

“As equipes e líderes indígenas e autoridades de Roraima disseram que ainda não se sabe ao certo quantas pessoas morreram neste genocídio, agravado por ser dentro de um território ianomâmi, de proteção e responsabilidade federal, pois o poder central permitiu garimpo ilegal, mercúrio contaminando as águas e domínio de áreas de proteção federal com presença também de pessoas do crime organizado”, concluiu o ministro.