Valor Econômico, v. 20, n. 4977, 08/04/2020. Brasil, p. A5

Saque de até R$ 6.220 pode custar R$ 120 bi ao FGTS

Edna Simão
Fabio Graner 


A possibilidade de se permitir o saque de até R$ 6.220 do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço para ajudar o trabalhador no enfrentamento dos efeitos da pandemia do coronavírus pode custar R$ 120 bilhões ao FGTS. Na avaliação de técnicos do governo e de conselheiros do fundo, a medida poderia inviabilizar o funcionamento do fundo, que não tem caixa disponível para cobrir essa expressiva saída de recursos.

O Valor apurou que, quando houver a transferência de R$ 21,5 bilhões do saldo do PIS/Pasep para o FGTS, o que ainda não tem data para acontecer, o saldo disponível do fundo será próximo de R$ 36 bilhões. Isso porque R$ 15 bilhões foram reservados no ano passado para fazer frente ao saque imediato, mas não foram retirados. Com esses recursos, a equipe econômica quer autorizar um novo saque. Pelas discussões internas, essa retirada poderia chegar a R$ 1 mil por cada conta do trabalhador.

Mas o governo e conselheiros do fundo estão preocupados com a pressão política para flexibilizar as regras de saque do fundo. Até o momento, por exemplo, há pelo menos três projetos de lei na Câmara dos Deputados tratando do assunto. Existem situações em que é autorizada a retirada total de recursos.

Além dos projetos de lei, na segunda-feira, o PT entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) fazendo o mesmo pedido para retirada de R$ 6,2 mil por trabalhador. Conforme foi noticiado pelo Valor, juízes se dividem sobre a possibilidade de liberação do FGTS a trabalhadores, com base no estado de calamidade gerado pela pandemia da covid-19.

Ainda existem poucos casos julgados sobre o tema, mas o Supremo Tribunal Federal (STF) logo deve definir a questão.

A avaliação de governo e conselheiros do fundo é de que o fundo não tem como suportar essa saída dos recursos até porque grande parcela já está comprometida com investimentos em habitação, saneamento básico e mobilidade urbana. Além disso, nos próximos meses, o FGTS terá perda de receita devido à possibilidade dada pelo governo de os empresários adiarem o pagamento das contribuições para o fundo para o segundo semestre. A expectativa ainda é que possa ter uma ampliação do saque com a perspectiva de aumento de demissão em detrimento do impacto da crise.

Uma das propostas que têm avançado na Câmara é o projeto de lei nº 714/2020, de autoria da deputada Patrícia Ferraz (Podemos/AP). Foi apresentado um pedido para que a matéria seja analisada em regime de urgência, mas ainda não houve decisão sobre o assunto. A proposta permite o saque emergencial de valores do FGTS, em razão da pandemia de coronavírus até o limite do teto do Instituto Nacional do Seguro Social (R$ 6.101,06) até 30 de abril. “Com o saque teremos mais uma medida que permitirá injetar dinheiro na economia e beneficiar a população em meio à desaceleração da economia mundial”, explica a deputada para  justificar o projeto de lei.

A Lei nº 8.036, de 1990, que trata do FGTS, autoriza o saque em algumas situações, entre elas, necessidade pessoal decorrente de desastre natural, conforme regulamento. O Decreto nº 5.113, de 2004, autoriza o saque em situação de emergência ou calamidade pública. Os trabalhadores também podem sacar o FGTS em casos de demissão, compra da casa própria, aposentadoria e doenças graves.