Valor Econômico, v. 20, n. 4977, 08/04/2020. Brasil, p. A3

Tarifa social contará com R$ 900 milhões do Tesouro

Daniel Rittner 


Após três semanas de discussões, o governo decidiu bancar a ampliação da tarifa social de energia elétrica com R$ 900 milhões do Tesouro Nacional. A medida é uma forma de aliviar os efeitos da pandemia de coronavírus para famílias de baixa renda, por 90 dias, dando 100% de desconto nas contas luz para a faixa de consumo até 220 kilowatts-hora por mês.

Segundo estimativas oficiais, a isenção temporária do pagamento pela eletricidade deve custar em torno de R$ 1,25 bilhão. O restante do orçamento virá de sobras na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), o fundo setorial que banca subvenções nas tarifas de energia. Há cerca de R$ 200 milhões do Programa Luz para Todos que não foram usados no ano passado. Ajuda também, no orçamento, a queda no preço dos combustíveis subsidiados para o abastecimento das usinas térmicas em sistemas isolados.

Com essa solução, o governo evita um aumento da CDE e impactos negativos para os demais consumidores, especialmente na região Centro-Sul do país - que contribuem mais com seu rateio. O orçamento do fundo para 2020 é de R$ 21,9 bilhões e o valor destinado especificamente à tarifa social alcança R$ 2,66 bilhões.

A MP está sob análise da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), segundo fontes, porque envolve recursos do Tesouro. Ela precisará ser analisada pelo Congresso Nacional, mas tem validade imediata após sua publicação. Outra alternativa, que chegou a ser discutida com senadores e acabou descartada, era redirecionar o uso de dinheiro das taxas de pesquisa e de desenvolvimento e de eficiência energética.

Têm direito à tarifa social famílias inscritas no Cadastro Único do Ministério da Cidadania ou pessoas que recebem o Benefício de Prestação Continuada (BPC). Hoje o desconto sobre a tarifa “cheia” de cada distribuidora de energia varia conforme o nível de consumo da residência: 65% (consumo de até 30 kWh por mês), 40% (21-100 kWh) e 10% (101-220 kWh).

Esta é a primeira vez, desde 2015, que o Tesouro volta a injetar recursos no setor elétrico. Naquele ano, o governo Dilma Rousseff adotou um plano de “realidade tarifária” para devolver esses custos para as contas de luz. Foi um movimento para reverter efeitos da MP 579, a medida provisória assinada pela ex-presidente em seu primeiro mandato, que causou uma confusão gera no setor.

Ontem a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) informou ter autorizado a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) a repassar para as distribuidoras do sistema interligado nacional e parte dos agentes do mercado livre recursos financeiros disponíveis para alívio futuro de encargos. A ação visa reforçar a liquidez do setor elétrico em meio à pandemia.

A medida antecipará R$ 2,022 bilhões reservados para as distribuidoras do ambiente de contratação regulada (ACR) e para 7.166 agentes do ambiente de contratação livre (ACL), beneficiando as três etapas da cadeia - geração, transmissão e distribuição - na manutenção de suas obrigações. De acordo com a CCEE, serão destinados R$ 1,4475 bilhão às distribuidoras e R$ 547 milhões para os consumidores livres.

A decisão da Aneel autoriza ainda a CCEE a efetuar novos repasses ao longo de 2020, “sempre que houver saldo positivo no fundo de reserva para alívio futuro de encargos”, informou a agência reguladora em comunicado.