Título: A gênese da beleza natural do Rio
Autor: Claudia Bojunga
Fonte: Jornal do Brasil, 04/12/2005, Internacional/ciência, p. A15

Pão de Açúcar abre, em janeiro, parte carioca do projeto Caminhos Geológicos, que conta a história das montanhas da cidade

Habituado a conviver com um dos mais belos cenários naturais do planeta, o carioca em breve passará a fazê-lo conhecendo a gênese das montanhas que o cercam. O projeto Caminhos Geológicos - que divulga a morfologia fluminense para a população - vai inaugurar, em janeiro de 2006, a primeira placa no Rio. O local não podia ser outro: o Pão de Açúcar (eleito no último Congresso Internacional de Geologia, em 2000, como um dos sítios mais importantes do mundo). Os visitantes poderão ler explicações sobre os tipos de rochas que compõem o morro e como se formou, há 500 milhões de anos. Um olhar instruído a respeito das montanhas transporta a imaginação para a Era Paleozóica, quando a região tinha vulcões e não ficava na costa. Maciços dos quais o Pão de Açúcar faz parte se formaram a partir da colisão das placas continentais da América do Sul e da África. O fenômeno gerou o a massa de Gondwana (ver figura). - Essa movimentação provocou um ''efeito sanfona'', o continente passou a ocupar um espaço muito menor, o que ''amassou'' as rochas - , analisa ao JB a geóloga Eliane Guedes, do Departamento de Recursos Minerais do RJ (DRM). O choque provocou a compressão das placas, gerando cadeias de montanhas. Ao mesmo tempo, elevou de tal forma a temperatura e a pressão que forçou o derretimento das rochas já existentes, gerando grandes volumes de magma (rochas fundidas de consistência pastosa, que ficam no interior da crosta). O resfriamento desse magma formou os granitos atuais. Posteriormente, o calor e nova deformação intensa formaram o Gnaisse Facoidal, rocha gerada a 25 km de profundidade. A erosão da superfície, por milhões de anos, provocou o afloramento dessas rochas, tornando-as visíveis. O formato ovalado - que se repete em outras montanhas próximas, como o Morro Dona Marta e mesmo em Niterói, se deve à maneira como as intempéries desgastam o gnaisse, descascando-o como uma cebola. Outro ícone da cidade, a Pedra da Gávea é da mesma época e, como o Pão de Açúcar, tem gnaisse (base) e granito (topo), mas com uma peculiaridade. Uma fratura na placa - chamada dique - permitiu a intrusão de um material diferente. Depois, a erosão desbastou a parte externa, restando a forma angulosa atual - que lembra uma esfinge. Bem perto, outra curiosidade: a fratura, preenchida com rocha basáltica na qual foi escavada a piscina de água salgada no clube Costa Brava, na Joatinga. Esta manifestação é de outro período, o da separação do Gondwana. Há 130 milhões de anos, as placas, devido à pressão da lava vulcânica, começaram a se afastar, criando o Oceano Atlântico e o afloramento do basalto. - É só imaginar o processo como um recheio de bolo em que quanto mais quantidade houver mais distantes as partes vão ficar uma da outra - compara Kátia Mansur, também geóloga do DRM. O departamento acabou de produzir um CD-Rom sobre os recursos minerais do Estado. A paisagem, no futuro, deverá sofrer alterações. Numa projeção, Kátia Mansur calcula, por exemplo que, provavelmente, lagoas como a da Barra e a Rodrigo de Freitas irão sumir do mapa. - A tendência natural é que os sedimentos dos rios fiquem entulhados, provocando o assoreamento. O homem acelera o processo - afirma Kátia. Os próximos pontos do município nos Caminhos Geológicos deverão ser a estação das Barcas, com detalhes da Baía de Guanabara, e o Aterro do Flamengo. Desde 2001, mais de 30 placas já foram instaladas, a maior parte em Búzios e Arraial do Cabo. - As pessoas vão poder olhar para a natureza e entender o que estão vendo - define o Secretário estadual de Energia, Indústria Naval e Petróleo do Rio de Janeiro, Wagner Granja Victer.