Título: Ministro defende STF
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 05/12/2005, País, p. A2

Em meio às críticas generalizadas ao Supremo Tribunal Federal (STF) pela concessão de liminares ao ex-deputado José Dirceu durante seu processo de cassação, o ministro Gilmar Mendes, que deverá assumir a presidência do tribunal no biênio 2008-2010, defendeu as decisões dos colegas e contestou a tese de interferência do Judiciário no poder Legislativo. A reclamação foi feita por diversos parlamentares durante a tramitação do processo do ex-ministro chefe da Casa Civil e reforçada por recente pesquisa feita com mais de três mil juízes pela Associação dos Magistrados Brasileiros. Nesse quesito, o tribunal ganhou nota 3,7 em uma escala de zero a 10. O magistrado rebate os críticos:

- Esse tipo de afirmação surge em determinados momentos e é feita, entre outros, por parte de parlamentares e políticos interessados nessa ou naquela decisão. Ela reflete uma desinformação histórica - afirma.

Gilmar refere-se ao comportamento histórico do STF, que, para ele, não está de acordo com as análises feitas no calor da crise.

- Quem assume esse juízo deve ter o ônus da prova e enumerar casos em que o Supremo tomou decisões aberrantes, que comprometessem sua independência. Falta uma massa crítica que analise o tribunal, não em momentos específicos, mas ao longo da história, como durante a ditadura militar, quando foram ''aposentados'' pelo Ato Institucional nº 5 os ministros Victor Nunes Leal, Hermes Lima e Evandro Lins e Silva - explica o ministro, que é também vice-presidente do Tribunal Superior Eleitoral.

Gilmar Mendes foi um dos cinco integrantes do tribunal a votar contra a concessão da liminar pedida pelo ex-deputado José Dirceu para que o processo de cassação de seu mandato fosse refeito no Conselho de Ética da Câmara, adiando a votação do relatório final em plenário. Em face do empate entre os que aceitavam o pedido e os que o negavam, sua corrente aderiu ao voto do ministro Cezar Peluso, permitindo a realização da sessão que cassou Dirceu no mesmo dia, desde que fosse retirado do relatório o depoimento de Kátia Rabello, presidente do Banco Rural e testemunha de acusação ouvida depois das de defesa.

Para Gilmar, esse julgamento demonstra a independência dos ministros em relação ao ''suposto interesse do governo'' de preservar o mandato do ex-deputado. Os números sustentam sua posição. Dos quatro ministros do STF indicados pelo presidente Lula, apenas dois aceitaram os argumentos da defesa de José Dirceu: Ayres Britto e Joaquim Barbosa.

Gilmar lembra também o julgamento ocorrido em junho deste ano, no qual o STF determinou, por nove votos a um, que fossem nomeados pelo presidente do Senado, Renan Calheiros, os integrantes da CPI dos Bingos, destinada a apurar as ligações das casas de jogo e do crime organizado com Waldomiro Diniz, ex-subchefe para Assuntos Parlamentares da Casa Civil.

Sobre a possibilidade de mudança no processo de escolha de ministros para o Supremo (indicação pelo presidente da República e aprovação pela maioria absoluta do Senado), o ministro demonstra ceticismo. Embora admita que a aprovação do nome indicado pelo presidente não é objeto de discussão da opinião pública - representada pelos senadores -, o magistrado explica que a alternância de poder nos últimos anos garante o pluralismo no tribunal.

- Desde a Constituição de 1988, tem havido a sucessão no poder de forças políticas antagônicas, o que permitiu, por exemplo, que Fernando Henrique Cardoso indicasse três nomes para o Supremo e que o presidente Lula nomeasse quatro ministros. Isso tem permitido que o tribunal tenha uma coloração bastante plural - explica o ministro, completando em seguida: - Seria bom confiar a escolha dos ministros do STF a um colegiado formado por associações de magistrados, procuradores e advogados, como muita gente quer? Acho bem provável que as escolhas venham a incidir sobre os dirigentes dessas entidades ou seus candidatos - questiona Gilmar.