O Globo, n. 32526, 26/08/2022. Política, p. 8

Escolher o menos pior não vai dar certo



Em quarto lugar, numericamente, nas pesquisas de intenção de voto, Simone Tebet, a candidata do MDB à Presidência, afirmou que a campanha desse ano será marcada pelo “imponderável”, para explicar por que acredita nas suas chances de chegar ao segundo turno e criticou a polarização entre Jair Bolsonaro (PL) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao participar de sabatina, ontem, promovida pelo GLOBO, pelo Valor e pela rádio CBN e diz confiar na conquista dos votos dos indecisos para se eleger.

A equipe do Fato ou Fake, ferramenta de checagem do Grupo Globo, analisou as respostas de Tebet e constatou exageros e alguns números errados ao sustentar seus argumentos. Ao falar de economia, por exemplo, ela acertou ao citar que houve decréscimo da participação da indústria no PIB nos últimos 15 anos, mas exagerou, ao justificar sua posição contra a privatização da Petrobras, quando estimou em R$ 600 bilhões o valor de mercado da companhia (é de R$ 465 bilhões). A senadora também tropeçou ao afirmar que, em 2015, 50 senadores endossaram o projeto de lei que previa a impressão de cada voto depositado na urna eletrônica: foram 36 votos a favor, inclusive o dela, mas o texto foi derrubado pelo STF.

Teto de gastos

Favorável ao teto de gastos, Tebet diz, porém, que pretende tratar Ciência, Tecnologia e Inovação como investimento, e não gasto.

— O Brasil não cresce sem indústria. Temos que investir muito em agenda de tecnologia e produtividade. Nos últimos15 anos, tivemos decréscimo da participação da indústria. Temos que investir muito em agenda de tecnologia e produtividade. É possível enxugar a máquina sem furar o teto; a única questão é a Ciência, Tecnologia e Inovação. Não podemos aceitar que isso seja custo, é investimento.

Privatizações

A candidata se posicionou contra a privatização da Petrobras, criticando o ministro Paulo Guedes e defendeu “critérios” na venda de empresas públicas à iniciativa privada:

— Sou liberal na economia, mas não sou nem fiscalista sem alma e muito menos me aproximo desse pseudo liberalismo do atual ministro da Economia. A Petrobras, nos últimos anos do governo atual, gerou R$ 440 bilhões. Se avaliar para vender hoje, vai valer R$ 600 bilhões. Temos mais ou menos 49 estatais, mais de cem subsidiárias. Queremos critérios, não é privatizar por privatizar. Não é Estado mínimo ou máximo, é aquilo que ele se propõe a fazer: regular o mercado, fiscalizar e controlar. Mas o grande papel do Estado é prestar serviço de qualidade à população.

Orçamento secreto

A senadora prometeu dar mais transparência às emendas do relator, o chamado orçamento secreto, e detalhar a aplicação dos valores destinados:

— O político só tem medo de uma coisa: o povo, o que o povo vai dizer. Quando você der a transparência, com uma canetada, para o orçamento secreto, você vai ver quem é que realmente levou esse dinheiro. Foi bem aplicado, sem problemas. Mas a maioria desses recursos foi para os rincões mais distantes do Nordeste onde o serviço não foi executado.

Terceira via

Mesmo com o baixo percentual de intenção de votos, Tebet diz haver espaço para uma candidatura fora do cenário polarizado, principalmente pelo alto número de indecisos:

— Estamos com medo, votando em um para não ter o outro. É a campanha do ódio, da segregação, da polarização e do extremismo. Não aceito o Brasil na maior crise do país ter que escolher o menos pior. Não vai dar certo. Qualquer um que ganhar vai arrastar o segundo turno para 31 de dezembro de 2026. Não passa reforma, tudo será difícil.

Indagada sobre como o centro pretende retomar os votos que migraram para a extrema-direita, admitiu:

— O centro democrático se perdeu no meio do caminho, uma parte foi para o fisiologismo, para a corrupção. Nunca participei disso, mas o meu partido, parte dele, esteve envolvido nos escândalos do governo do PT. Inclusive essa é a ala que não me apoia, não faço questão que me apoie. A única candidatura capaz de acabar com a polarização, unir o Brasil e trazer estabilidade, previsibilidade e segurança jurídica é uma candidatura de centro.

Educação

Tebet destacou a reforma feita pelo ex-presidente Michel Temer no ensino médio, não totalmente implementada. E quer garantir período integral:

— Toda escola estadual que garantir período integral para os nosso jovens vai ter R$ 2 mil por aluno pagos para o estado.

E defendeu o projeto da poupança jovem:

— Vamos depositar, todo final do ano, um dinheiro para cada ano que o jovem concluir no ensino médio. No final, ele vai tirar esse dinheiro para comprar o que ele quiser.

Meio ambiente e invasões

Tebet afirma que é possível colocar de pé o projeto do desmatamento ilegal zero da Amazônia e justifica a ausência do cerrado, bioma mais afetado pelo problema nas regiões Norte e Centro-Oeste do país, em seu plano de governo.

— O desmatamento ilegal é zero. Só isso já resolve o problema com o Acordo de Paris. Se é ilegal, não pode servir para o cerrado, para a caatinga, para os pampas gaúchos, para nada. Temos que fazer duas distinções: o desmatamento ilegal é responsável por praticamente 98% dos problemas, inclusive de emissão de CO2. Esse é o objetivo central. A partir daí é uma discussão com o Congresso Nacional de legislação. Meio ambiente é vida, ou entendemos isso ou as portas se fecham para o Brasil.

Sobre as invasões em áreas indígenas demarcadas e não demarcadas, foi taxativa:

— Sou a favor de toda demarcação de terra indígena, mas sou contra toda invasão dessas áreas antes.

Aborto

Auto declarada progressista, Tebet foi questionada sobre o fato de ser contrária à legalização do aborto.

— Conhecendo o Congresso Nacional, um projeto de legalização do aborto não passa, inclusive porque a bancada feminina no Senado, hoje, não aceita. Sou contra o aborto, a não ser nos casos previstos na legislação..

Misoginia

Embora se diga vítima da misoginia na política, a senadora não considerou misógino o comportamento de alguns de seus correligionários no lançamento de sua candidatura, quando disseram ter prestado atenção na forma como ela e sua vice, Mara Gabrilli (PSDB), se arrumaram para o evento. E afirmou que o país precisa de uma mulher para “arrumar a casa ”:

— Eles porque foram os primeiros a entender o dever de haver uma chama 100% feminina. Podem ter exagerado, sim, (nos comentários), mas foram extremamente corretos na condução. Mas o que falaram sobre o amor, eles têm razão. Ninguém ama como uma mulher. E é disso que o Brasil está precisando, de uma mãe ou uma mulher para arrumar a casa. Mas sou vítima de misoginia e de violência política quase todo dia.

Reeleição

A candidata garantiu que não tentará a reeleição e que, caso seja eleita, levará um documento ao TSE se comprometendo com o fim da reeleição. Afirmou que era favorável ao segundo mandato, mas mudou de ideia:

— Eu era a favor. Até entender que o Lula criou o mensalão para se reeleger, depois o petrolão...A Dilma quase quebrou uma estatal. Agora, (há) o presidente Bolsonaro e sua trupe, o orçamento secreto. É ganância de poder.

Golpe e urnas eletrônicas

Tebet afirmou que não acredita na hipótese de um golpe por parte do presidente Bolsonaro, caso ele perca as eleições:

— Todos nós temos que cumprir a Constituição, fizemos um juramento quando entramos na vida pública. Ninguém mais vai fechar o Congresso. Acredito nas instituições, que elas estão fortes.

Tebet também já questionou as urnas eletrônicas. Mas hoje diz confiar no processo:

— Em 2015, todos nós estávamos dizendo isso. Não foi um projeto específico, nós estávamos votando uma minirreforma eleitoral e partidária. Eu sou da época analógica, não sabia naquela época sequer que as urnas não estavam ligadas na internet. Hoje sou a primeira a defender. Foi feita auditagem. O TSE esteve no Congresso Nacional, as urnas são absolutamente seguras.