Valor Econômico, v. 20, n. 4977, 08/04/2020. Finanças, p. C1

Crise acentua os déficits dos fundos de pensão

Juliana Schincariol 


A Abrapp, associação que representa os fundos de pensão, espera um “crescimento gigantesco” dos déficits das fundações em 2020. Os resultados serão pressionados pelo avanço do coronavírus e seus efeitos sobre o mercado acionário. Os fundos têm parte importante de suas carteiras em ações de empresas que vem sofrendo com os efeitos da pandemia. “Será um ano muito complicado para bater as metas atuariais”, afirmou o presidente, Luís Ricardo Martins.

Com oito meses do ano pela frente, ainda é difícil estimar o tamanho do rombo, mas há representantes da indústria que preveem que o resultado negativo pode chegar a R$ 100 bilhões ao fim do ano. “Não é possível projetar qualquer valor com 100% de certeza para o final de 2020. A volatilidade está muito elevada”, disse Lúcio Capelletto, que comanda a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc).

Para tentar minimizar esse impacto, a Abrapp apresentou 19 propostas para as autoridades do governo. “Precisamos de medidas emergenciais para amenizar os impactos no segmento. São imediatas, excepcionais e provisórias. O objetivo é desonerar patrocinadores, empregados e participantes, aposentados e assistidos”, disse ao Valor o presidente da associação. Para Martins, o governo está sensível às mudanças. O Conselho Nacional de Previdência Complementar (CNPC) se reunirá na quinta-feira e deve discutir os temas.

Um dos pedidos é a suspensão, por 90 dias, das contribuições ordinárias dos participantes, que pagam 8% de seus benefícios todo mês. A medida seria válida para os planos de contribuição definida ou variável, que não têm risco de déficit atuarial, e sim uma redução do saldo da conta. O mesmo foi pedido para as contribuições extraordinárias, referentes ao equacionamento de déficits, caso da Petros (Petrobras) e da Funcef (Caixa).

Todos esses descontos, ordinários ou não, são paritários. Por lei, os associados e patrocinadores precisam contribuir igualmente. “Isso desoneraria a empresa do percentual, e também o participante. Depois, com base nas avaliações atuariais, a diferença seria cobrada”, disse Martins. Há ampla discussão sobre o assunto, mas ainda não há decisão. “Seria uma medida para desonerar também os participantes e assistidos, enquanto chefes de família.”

No caso das contribuições extraordinárias para sanear déficits de planos de benefício definido, o prazo de suspensão proposto, de 90 dias, não impactaria os planos no futuro, na visão dele. “Os planos terão condições de se recuperar e cobrar a diferença.”

“Isso vai variar de entidade para entidade. É uma realidade muito particular de cada uma ou até mesmo para cada plano. Por enquanto não tivemos qualquer conversa interna, qualquer solicitação. Quando [as medidas] forem aprovadas, vamos discutir se haverá necessidade de colocar em prática”, disse o presidente da Funcesp (fundação que representa as empresas elétricas de São Paulo), Walter Mendes.

A Abrapp pediu também a criação de um grupo de trabalho com agentes do governo para estudar a revisão da resolução 30, que normatiza o equacionamento de déficits e reversão de superávits. “Ela precisa de adequações pontuais. São medidas que podem amenizar e permitir equacionamento mais suave”, afirmou o presidente da entidade.

A Fundação Real Grandeza (Furnas) fechou 2019 em uma situação confortável - superávit de R$ 420 milhões em seu plano de benefício definido, na visão do presidente Sérgio Wilson Ferraz Fontes. “Essa crise não tem precedentes e as medidas têm que ser pensadas nesse sentido. Ainda não chegamos no auge dela e não sabemos como sair”, disse. No primeiro bimestre, o resultado positivo caiu a R$ 30 milhões. Um equacionamento de déficit, se ocorrer, seria a partir de um resultado negativo de R$ 1,8 bilhão. “Ainda temos ‘gordura’ para queimar. E a análise sobre essa necessidade ocorreria apenas em março de 2021.”

Fundações como Previ (Banco do Brasil) e Funcef deram aos participantes o direito de decidir pela suspensão do pagamento de parcelas de empréstimos concedidos. No caso do da Previ, a medida, se desejada pelo tomador, é válida para maio e junho. Segundo a fundação, o objetivo é ajudar na preservação do fluxo de caixa dos associados e atenuar possíveis impactos negativos que os participantes e seus familiares possam sofrer no orçamento devido à pandemia do novo coronavírus. Na Funcef, a suspensão é de até três meses. Da mesma forma, a Petros anunciou que todos os participantes poderiam suspender o pagamento das parcelas de empréstimo por três meses, de abril a junho. O período de opção foi aberto em 26 de março e terminou em 5 de abril. A medida teve como objetivo ajudar os participantes a enfrentar as consequências financeiras provocadas pela pandemia.