Correio Braziliense, n. 21867, 29/01/2023. Política, p. 4

Cooptação foi lentamente construída  



O temor de que o presidente Jair Bolsonaro (PL) estivesse insuflando sua base de apoiadores nos quartéis para deflagrar um golpe de Estado ganhou corpo em 2021 quando, no feriado de Sete de Setembro, em São Paulo, quando o então chefe de governo afirmou, em discurso aos apoiadores, que só deixaria o Palácio do Planalto “preso ou morto”. A partir daquele momento, com a popularidade em queda, principalmente por causa da errática política de enfrentamento da pandemia de covid-19, ele intensificou os ataques à Justiça Eleitoral e ao Supremo Tribunal Federal. E fazia questão de dizer “meu Exército” sempre que se referia à Força, como se fosse a garantidora de seu governo e de suas decisões.  

No feriado da Pátria do ano passado, Bolsonaro misturou comemoração cívica com palanque eleitoral, sem constrangimento. Promoveu comícios pela reeleição (ao arrepio da legislação eleitoral) em São Paulo e em frente ao Forte de Copacabana, no Rio de Janeiro, com direito a exibição da Esquadrilha da Fumaça e dos paraquedistas do Exército. Dali participou de uma motociata pediu votos na “luta do bem contra o mal”, chamou o atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva, seu principal oponente, de “ladrão” e destacou ações de seu governo, como a queda do preço da gasolina e do diesel.  

Com a derrota do projeto de reeleição, bolsonaristas radicais começaram a se reunir na frente dos quartéis para reivindicar uma intervenção militar no país que impedisse a posse de Lula. Depois do terrorismo de 8 de janeiro, todos foram desmontados pelas polícias militares dos estados, mas as marcas da contaminação da extrema direita entre os militares permaneciam expostas.  

Despreparo  

A suspeita de que o Exército não se preparou para defender o Palácio do Planalto dos vândalos bolsonaristas pôs em xeque o comando do chefe do Batalhão da Guarda Presidencial (BGP), coronel Paulo Jorge Fernandes da Hora. Imagens gravadas durante a invasão reforçam a suspeita de leniência do grupamento diante dos invasores.  

A substituição de Da Hora já estava prevista para meados de fevereiro, de acordo com a lista de promoções aprovada pelo Alto Comando do Exército em maio do ano passado, a mesma que designou o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, para comandar o 1º Batalhão de Ações e Comandos, em Goiânia. Mas o próprio Da Hora decidiu antecipar sua saída.  

O governo também espera que o comandante Militar do Planalto, Gustavo Henrique de Menezes, tome a mesma atitude, já que a saída dele está prevista apenas para março. Até o fim da semana passada, mais de 80 militares perderam os cargos na estrutura da Presidência da República. (VD)