Correio Braziliense, n. 21870, 01/02/2023. Política, p. 3 
 
Uma sombra no favoritismo 

Raphael Felice 
 
 
Se há algumas semanas a reeleição de Rodrigo Pacheco (PSD-MG) à Presidência do Senado era dada como praticamente garantida, o cenário atual não é tão confortável para o parlamentar. A sombra é o crescimento da candidatura de Rogério Marinho (PL-RN), ex-ministro de Bolsonaro. 

Com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva apoiando Pacheco, a eleição ao comando da Casa repetirá a polarização vista no pleito para a Presidência da República, no ano passado. 

A conta feita nos bastidores indica vantagem para Pacheco. No entanto, a estimativa de 55 votos, feita por apoiadores do senador, pode ficar, na verdade, entre 43 e 47 votos. 

Além da oficialização da campanha de Marinho no último sábado, com apoio do bloco PL, PP e Republicanos, Pacheco perdeu força por conta da sua proximidade com o senador e ex-presidente da Casa Davi Alcolumbre (União-AP). 

Marinho buscou aval dentro do PSD, legenda de Pacheco, e conseguiu, oficialmente, o apoio de três senadores: o líder pessedista no Senado, Nelsinho Trad (MS); Samuel Araújo (RO) e o ex-tucano Lucas Barreto (AP). 

O motim contra o senador de Minas Gerais se dá pela proximidade com Alcolumbre. Pacheco pretende manter o parlamentar amapaense na presidência da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), o que desagradou ao PSD. 

O partido de Gilberto Kassab também não terá apoio de Pacheco para manter a Comissão de Relações Exteriores, justamente presidida por Trad. A tendência é de que o colegiado fique com Renan Calheiros (MDB-AL), também ex-Presidente do Senado. 

“Essa decisão é madura, sensata, na busca de uma reoxigenação que o Senado da República deve passar. Aqui, não tem grupo para fazer nenhum revanchismo contra A, B ou C”, disse o líder do PSD. “O lema maior aqui é uma reconexão do Senado com a sociedade, para fazer com que a gente possa, dentro daquilo que nos compete ser respeitado como instituição equilibrada e que também possam nos enxergar dessa forma para que a gente possa cumprir e fazer valer que preconiza a harmonia e a independência dos poderes.” 

Trad complementou, em evento na liderança do PL ao lado de Marinho: “Por isso, entendo que essa renovação seja imprescindível para o momento que estamos atravessando. Não foi fácil essa decisão dentro do PSD, uma pessoa que não temos nada contra ele, uma pessoa educada, equilibrada, mas que teve o seu momento com nosso apoio”. 

A proximidade com Alcolumbre também provocou divergência no PSDB. Os três senadores da legenda declararam apoio a outros candidatos. Izalci Lucas (DF) e Alessandro Vieira (SE) anunciaram voto em Marinho. Já Plínio Valério (AM) disse que vai votar em Eduardo Girão (Podemos-CE), o outro candidato ao cargo e também ligado ao bolsonarismo. 

Na bancada bolsonarista, as principais críticas a Pacheco são em sua resistência em pautar o impeachment de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), principalmente, de Alexandre de Moraes, que conduz o inquérito das fake news e dos atos antidemocráticos. O magistrado derrubou diversas contas de aliados do ex-presidente que publicaram nas redes sociais apoio a um golpe de Estado ao retorno da ditadura militar. 

Pressão 

Pacheco, no entanto, mostrou confiança na vitória. Em entrevista coletiva que oficializou o apoio do MDB à sua candidatura, ele afirmou que pretende continuar a combater ataques à democracia. “Vamos manter a defesa do Estado de Direito e pregar a harmonia dos Poderes. Recebi com muita alegria e satisfação esse apoio do MDB, que possui não só uma bancada quantitativa, mas de muita qualidade. Essa união representará nossa vitória amanhã (hoje) na Presidência do Senado”, enfatizou. 

Ele também afirmou que vai manter uma gestão de responsabilidade e “sem revanchismos ou ódio”. No MDB, apenas Ivete da Silveira (SC) anunciou dissidência e vai votar no candidato do PL. 

Marinho também mostrou confiança. Após ser visto como azarão, há algumas semanas, ele conseguiu cacife para uma eleição equilibrada, o que fez, inclusive, crescer a participação da família Bolsonaro nos bastidores das negociações. 

Além disso, o parlamentar eleito que tomará posse hoje contou com uma forte campanha nas redes sociais. Senadores de estados com forte público bolsonarista receberam diversas cobranças, algumas até agressivas, com pedidos de votos para Marinho e críticas a Pacheco. 

“Quem entende o papel de quem está na presidência de um poder como este, entende que ele (o presidente) tem de ser árbitro, mediador, tem que permitir que cada parlamentar tenha oportunidade de fazer seu mandato na sua integralidade e uma casa de paz, mas também de diálogo e debate. Temos votos suficientes para ganhar a eleição”, disse Marinho. 

O PL conta com traições a Pacheco para viabilizar a vitória de Marinho, mas os desacordos podem acontecer dos dois lados. 

O parlamentar que soube transitar 

Rodrigo Pacheco chegou ao Congresso pela porta da Câmara, onde ocupou a presidência da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ). Foi eleito ao Senado em 2018. Natural de Porto Velho (RO), mas com carreiras jurídica e política em Minas Gerais, é advogado criminalista e fez parte da defesa de um ex-diretor do Banco Rural no julgamento do mensalão. Tido pelos colegas como um dos mais republicanos entre os congressistas, o parlamentar foi alvo de queixas na pandemia por ter antecipado o descolamento do então presidente Jair Bolsonaro, que o ajudou a se eleger à Presidência do Senado, em 2021. Ele foi crítico reiterado ao negacionismo do então chefe do Executivo, embora tenha deixado que a abertura da Comissão Parlamentar de Inquérito da Covid (CPI da Covid) fosse determinada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). 

Leia em: https://flip.correiobraziliense.com.br/edicao/impressa/4237/01-02-2023.html?all=1