O Globo, n. 32531, 31/08/2022. Mundo, p. 24

Bol­so­naro volta a cri­ti­car Boric após Chile con­vo­car embai­xa­dor

Daniel Gullino


Um dia após o Chile convocar o embaixador brasileiro em Santiago para protestar contra declarações que Jair Bolsonaro fez no debate de domingo entre os presidenciáveis, o presidente voltou ontem a criticar o colega chileno, Gabriel Boric. Bolsonaro evitou comentar diretamente a declaração falsa que provocou o protesto — de que Boric ateou “fogo em metrôs” — mas disse que não deixou de “falar a verdade” e atacou a proposta de nova Constituição chilena.

— O presidente do Chile acabou de chamar seu embaixador, maneira que tem de mostrar insatisfação comigo. Se eu exagerei ou não, não deixei de falar a verdade. A Constituinte do Chile vai na contramão do que qualquer país democrático quer. E isso é problema deles? É problema deles. Mas o cidadão lá teve o apoio de um cara aqui do Brasil — disse Bolsonaro, candidato à reeleição, durante evento promovido pela União Nacional de Entidades do Comércio e Serviços (Unecs).

No domingo, durante o debate entre presidenciáveis, Bolsonaro criticou vários dirigentes sul-americanos de esquerda, buscando associá-los ao ex-presidente e candidato Luiz Inácio Lula da Silva. Disse então que “Lula apoiou o presidente do Chile também, o mesmo que praticava atos de tacar fogo em metrôs lá no Chile”.

Em resposta, na segunda feira a chanceler chilena, Antonia Urrejola, afirmou que as declarações foram “gravíssimas”.

— Lamentamos que tirem proveito do contexto eleitoral para polarizarem as relações bilaterais através da desinformação e das notícias falsas —disse Urrejola, que entregou uma nota de protesto ao embaixador brasileiro em Santiago, Paulo Roberto Soares Pacheco.

No debate, Bolsonaro referia-se às manifestações de outubro de 2019 no Chile, que começaram com reclamações sobre o aumento do preço do metrô, mas ganharam demandas sociais mais amplas.

Plebiscito sobre carta

Na época, Boric era deputado e atuou como um dos mediadores entre os manifestantes e o Legislativo para que houvesse uma saída institucional para a crise, com a convocação pelo Congresso do referendo em que os chilenos votaram, em 2020, pela convocação de uma Constituinte. Ao contrário do que diz o presidente brasileiro, o líder chileno não participou da destruição de patrimônio público.

A Constituição elaborada pela Convenção Constitucional, a que Bolsonaro se referiu ontem, será submetida a um plebiscito no próximo domingo. As pesquisas indicam que ela será rejeitada, mas há ainda um grande percentual de indecisos. Boric não participou do processo de elaboração do texto, mas a aprovação da nova Constituição, que substituiria a herdada da ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990), é considerada fundamental para o sucesso de suas propostas de governo.