O Globo, n. 32470, 01/07/2022. Política, p. 4

Partilha eleitoral

Natália Portinari
André de Souza
Daniel Gullino
Alice Cravo
Camila Zarur
Sérgio Roxo
Gustavo Schmitt


O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) definiu ontem que cada candidato a presidente poderá desembolsar no máximo R$ 88,2 milhões neste ano e, caso passe para o segundo turno, mais R$ 44 milhões. O valor deve ser usado com despesas como viagens e publicidade na TV e nas redes sociais, entre outros gastos de campanha. Com um fundo eleitoral turbinado, de R$ 4,9 bilhões, partidos afirmam que o limite deve incentivar o investimento em um número maior de nomes na disputa pelas vagas no Legislativo.

Nos últimos meses, dirigentes partidários procuraram o presidente da Corte, ministro Edson Fachin, pedindo que o limite para as campanhas presidenciais fosse ampliado. O PT, por exemplo, pretendia gastar até R$ 200 milhões com a candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A decisão do TSE, contudo, foi de corrigir o teto de gastos com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que mede a taxa de inflação, calculada em 26% nos últimos quatro anos. Assim, o partido decidiu ontem que vai investir os R$ 132 milhões permitidos na disputa pelo Palácio do Planalto, bem acima dos R$ 39 milhões usados por Fernando Haddad em 2018.

Índice de aumento

A Corte também seguiu o mesmo índice para limitar os gastos de candidatos aos demais cargos. Para deputado federal, por exemplo, o máximo será R$ 3,1 milhões, e para deputado estadual, R$ 1,2 milhão. Nas eleições para governador e senador, os limites variam de acordo com o eleitorado de cada estado. Em São Paulo, maior colégio eleitoral, o valor poderá chegar a R$ 39,6 milhões nos dois turnos.

— O IPCA acumulado será de 26%, ou seja, haverá acréscimo de quase um quarto do teto de limite para cada candidatura — afirmou o ministro Alexandre de Moraes.

Em 2018, o valor do fundão foi de R$ 1,7 bilhão. Já com valores corrigidos pela inflação, o aumento no montante para 2022 foi de 128%, maior do que a correção adotada pelo TSE para o teto de gastos.

Ontem, o TSE reafirmou ainda que partidos e federações devem cumprir individualmente o mínimo de 30% de candidaturas femininas nas eleições para deputado.

Enquanto no PT o valor para a campanha de Lula já foi definido, o PL, do presidente Jair Bolsonaro, ainda discute como dividir os recursos após o partido receber uma leva de novos filiados. A expectativa da cúpula da legenda era gastar até R$ 150 milhões com a disputa presidencial, mas os valores terão que ser reajustados após a decisão do TSE. Dirigentes da sigla, contudo, admitem que apenas com o fundo eleitoral não será possível financiar todas as candidaturas que pretendem lançar e apostam em doações de pessoas físicas.

— Para presidente, a gente ainda tem a opção da vaquinha virtual. Estamos apostando muito nisso — afirmou o deputado Capitão Augusto (SP), vice-presidente do PL.

Aliado de Bolsonaro, o presidente do PP, deputado Claudio Cajado (BA), afirmou que a sigla não pretende contribuir com a campanha presidencial e vai priorizar candidatos à Câmara. O partido definiu que vai destinar para quem disputar esse cargo um valor igual ao do teto de 2018, sem correção: R$ 2,5 milhões.

Mesmo com o fundo eleitoral maior neste ano, Cajado afirma, no entanto, que faltarão recursos. Isso porque, como não haverá coligação proporcional, a legenda vai lançar um número maior de candidatos a deputado.

— Antes, por exemplo, o PP lançou nove candidatos na Bahia. Agora, devem ser 40. Isso vai trazer um gasto muito maior.

O presidente do Republicanos, deputado Marcos Pereira (SP), por sua vez, afirmou que a sigla precisará fazer ajustes no orçamento a partir da decisão do TSE. Hoje, a legenda tem R$ 242 milhões no fundo.

— Os valores que já eram escassos (para cada candidato) ficarão mais ainda — afirmou Pereira.

Ele diz ainda que, a exemplo do PP, o Republicanos não dará nenhuma fatia do orçamento para apoiar a campanha de Bolsonaro. A prioridade de investimento será nas campanhas para deputados federais e senadores, seguido por deputados estaduais e governadores, na ordem de importância.

Mais candidaturas

Para Marcelo Issa, diretor da Transparência Partidária, com um teto menor do que inicialmente esperado, deve haver uma pulverização maior na distribuição de recursos, na comparação com 2018:

— O fim das coligações na eleição proporcional também deve estimular as siglas a lançarem mais candidatos.

No PSD, por exemplo, que tem R$ 350 milhões de fundo eleitoral, o pleito dos deputados federais com mandato é de gastar no mínimo de R$ 2,5 milhões. O presidente da legenda, Gilberto Kassab, porém, ainda não comunicou oficialmente os valores a que cada um terá direito, mas a expectativa é de que os candidatos sem mandato tenham que negociar “no varejo”, a depender do interesse do partido em investir em suas campanhas.

No União Brasil, que é dono da maior parcela do fundo (R$ 782,5 milhões), o reajuste pela inflação já era esperado, segundo o deputado Junior Bozzella (UB-SP), vice-presidente do diretório paulista, e deve estimular que o dinheiro seja distribuído em mais candidaturas.

— Em vez de se comprometer só com quem tem mandato, dá para estimular a chapa e dar oportunidade para quem está fora.

Carlos Lupi, presidente do PDT, afirma que a definição do teto de gastos não deve mudar os planos do partido, que estima investir cerca de R$ 24 milhões dos R$ 253,4 milhões do fundo na campanha presidencial de Ciro Gomes:

— Nós temos que dividir o pouco que temos entre um candidato a presidente, oito governadores, sete senadores e cerca de 1.500 deputados estaduais e federais. O teto para nós é inatingível.

No PSDB, prioridade em SP

No PSDB, o que tem gerado mais desconforto é a prioridade dada pelo partido à candidatura de Rodrigo Garcia ao governo de São Paulo. A campanha do ex-vice de João Doria vai receber o teto e a maior fatia do fundão: cerca de R$ 21 milhões. Alguns diretórios questionam o que chamam de “disparidades”, e a temperatura deve aumentar ainda mais no dia 6 de julho, quando o partido deverá bater o martelo nesse quesito.

Lideranças da direção nacional, no entanto, minimizam as reclamações e dizem que é normal que sejam mais contemplados os parlamentares com mandato eestados onde o partido é governo. Não por acaso, os pré-candidatos Eduardo Leite (RS) e Eduardo Riedel (MS) também receberão o teto: R$ 9, 1 milhões e R$ 4, 1 milhões, respectivamente. Os demais candidatos a governador terão recursos distribuídos a depender da performance nas pesquisas. Há, inclusive, quem defenda que candidaturas sejam deixadas de lado em alguns estados para que sobre mais dinheiro. Esse é o caso das pré-candidaturas do ex-deputado Marcos Pestana em Minas Gerais e do deputado estadual Cesar Silvestri, no Paraná. Ambos são vistos com chances remotas na disputa.