O Globo, n. 32473, 04/07/2022. Política, p. 4

Pressão interna

Sérgio Roxo
Gustavo Schmitt


A 90 dias das eleições, a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de corrigir o teto de gastos das campanhas pela inflação dos últimos quatro anos reacendeu a disputa nos partidos pelo rateio do dinheiro do fundo eleitoral, que atingirá a cifra recorde de R$ 4,9 bilhões. Na maior parte das siglas, os deputados federais com mandato devem ficar com uma fatia expressiva dos recursos.

Enquanto alguns dirigentes adotam o discurso de que a correção dos tetos por um valor inferior ao aumento geral do fundo permitirá uma democratização da distribuição do dinheiro, parlamentares já iniciaram articulações para elevar a quantia a que terão direito para as campanhas. A verba, que foi de R$ 1,7 bilhão em 2018, agora saltou 188%, em valores nominais enquanto os tetos das disputas de cada cargo serão reajustados em 26%. O tamanho da bancada na Câmara é o fator preponderante para a divisão da verba pública entre os partidos.

No MDB, a direção já havia anunciado aos atuais 37 deputados federais que cada um deles teria R$ 2,5 milhões. Na sexta-feira, porém, um parlamentar da sigla afirmou ter certeza de que, após a mudança do teto, haverá pressão para elevar esse valor — e reação no sentido contrário de postulantes a cargos majoritários.

Com a previsão atual, se todos os deputados federais emedebistas disputarem a reeleição, o partido gastaria mais de R$ 90 milhões só para custear essas campanhas, o que representa mais de um quarto do total de recursos a que o MDB terá direito.

No PSDB, a distribuição ainda não está fechada, mas também há pressão da bancada federal para aumentar os repasses. Os 20 deputados federais esperavam ser contemplados com R$ 2,4 milhões. Agora, coma correção há uma articulação em curso para que o valor se aproxime do teto de R$ 3,1 milhões. Internamente, há um acerto de que os candidatos com mandato terão tratamento especial, mas o martelo só será batido nesta semana.

Lideranças dizem que o repasse depende do “potencial eleitoral” dos candidatos. Esse deve ser o caso de nomes vistos como puxadores de votos, casos do senador José Serra (SP) e dos ex-governadores Marconi Perillo (Goiás) e Beto Richa (Paraná). A possibilidade de que o governador de São Paulo, Rodrigo Garcia, receba o teto, previsto em R$ 26 milhões no primeiro turno no estado, também vem gerando tensões internas, em função da disparidade de valores na comparação com outras unidades da Federação.

No PT, os atuais deputados reivindicam R$ 2 milhões cada um. Nessa hipótese, se os 48 parlamentares homens da bancada disputarem a reeleição, a verba chegaria a R$96 milhões. O diretório nacional do partido aprovou que os candidatos homens a deputado receberão R$ 148 milhões, enquanto as mulheres ficarão com R$151 milhões. O PT ainda não decidiu exatamente quanto cada parlamentar vai receber, e a direção não quer tornar pública essa discussão. A campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ficará com R$132 milhões, o teto em caso de dois turnos.

No PL, do presidente Jair Bolsonaro, o vice-presidente da sigla, deputado Capitão Augusto( SP ), reclamada falta de recursos. A sigla vai receber
R$ 286 milhões e deve destinar quase metade para a campanha do mandatário.

— Como agora somos obrigados a lançar chapa completa de candidatos nos estados, a maioria dos deputados não vai receber o teto. A priorida de é a eleição do presidente. O dinheiro está curto.

Mais candidaturas

O PSB vai repassar 80% do fundão para as campanhas de deputado, o que representa R$ 215 milhões. A expectativa é que cada um dos atuais 24 representantes da sigla na Câmara fique com pelo menos R$ 2 milhões. Os candidatos a governador e ao Senado da legenda terão R$ 54 milhões. Há ainda no PSB a expectativa de reduzir o número de candidatos a governador, mantendo apenas os nomes vistos como prioritários.

— Lamentamos que não temos recursos suficientes para passar aos nossos candidatos majoritários. A tendência é repassar a metade do teto para eles — afirmou o presidente do PSB, Carlos Siqueira.

No caso do União Brasil, dono da maior fatia do fundo, 65% dos recursos vão para eleição proporcional (R$ 508,6 milhões) e 35% para as majoritárias.

O cientista político Claudio Couto, da FGV, avalia que o fim das coligações nas eleições proporcionais é outro fator que obrigou as legendas a redefinirem estratégias:

— Vão ter que lançar mais gente e o valor para cada um tende a cair. Deve haver uma briga por recursos, e aqueles que têm mandato querem uma fatia maior.