Título: Valério: empréstimos de fachada
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 09/12/2005, País, p. A2
O ex-superintendente do Banco Rural Carlos Roberto Godinho confirmou ontem aos integrantes da CPI dos Correios que os empréstimos concedidos às agências de publicidade de Marcos Valério Fernandes de Souza nunca foram pagos, ainda que as contas do mineiro tivessem fundo para quitar as dívidas. Em depoimento que durou cerca de quatro horas, Godinho acabou comprometendo o Banco Central (BC) que, segundo ele, realizou uma contundente fiscalização sobre as operações entre o Banco Rural e Marcos Valério. No entanto, o relatório apresentado pelo BC em Belo Horizonte não trouxe à tona as irregularidades.
- Como fiscais eles tinham condições de levantar possíveis irregularidades, mas não o fizeram - afirmou Godinho.
As suspeitas sobre o procedimento do Banco Central na investigação dos empréstimos, que alcançaram R$ 55 milhões, constam no relatório parcial da CPI. Com a confirmação de Godinho, a comissão pediu ao Ministério Público da União e ao próprio BC um levantamento sobre o caso. Os parlamentares esperam o resultado das auditorias para incorporar ao relatório final.
O relator da comissão, deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), ainda não vê necessidade de convocar diretores do BC para prestar esclarecimentos. Segundo o ex-superintendente, os empréstimos foram feitos para ''mascarar a entrada de recursos'' nas contas de Marcos Valério, como forma de lavagem de dinheiro. Mas ele não consegue apontar qual seria a verdadeira origem. Apenas em setembro deste ano, quando Valério já estava sob a mira de investigações, o BC determinou ao Banco Rural o provisionamento dos empréstimos.
Também nesta época o BC estabeleceu o aumento do grau de risco do empréstimo. Godinho ressaltou aos integrantes da CPI que desde os primeiros recursos repassados pelo Rural às agências de Marcos Valério - R$ 29 milhões só em 2003, para a SMPB e Grafite - o banco não teve qualquer garantia de recebimento. Nem mesmo houve provisionamento do repasse, que não estava sendo liquidado nem amortizado.
Ainda segundo Godinho, a movimentação financeira das contas da empresa eram dez vezes superior ao rendimento da mesma. Ele disse que todas estas irregularidades foram detalhadas em um relatório semestral. Mas, segundo ordens superiores - que inclusive passavam pela presidente do Banco Rural, Kátia Rabelo - tais informações foram retiradas do documento, para controle interno. Godinho disse que não pode provar o que foi apagado.
- Pediremos os relatórios que Godinho fez ao Banco Rural para verificar se chegaram ao BC - disse o sub-relator Gustavo Fruet (PSDB-PR).
O ex-funcionário do Rural confirmou ainda uma tentativa de Marcos Valério de criar o ''Banco dos Trabalhadores'', instituição para realizaria empréstimos consignados a trabalhadores e, poderia servir como uma forma mais segura de realizar as movimentações financeiras para o PT. Godinho disse que chegou a participar de um encontro em São Paulo, em 2003, com representantes do BMG e da empresa NetCash. Os parlamentares consideram uma tentativa de tráfico de influência de Marcos Valério, que chegou a fazer visitas ao BC para tratar do assunto.