Título: Orçamento vira moeda de troca
Autor: Daniel Pereira
Fonte: Jornal do Brasil, 09/12/2005, País, p. A3

Lideranças da base de apoio ao governo e da oposição já dão como certo que o Orçamento Geral da União para 2006 não será aprovado neste ano. Se o projeto não for sancionado até o final de dezembro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva terá autorização para realizar a partir de janeiro gastos obrigatórios, como pagamentos do funcionalismo e da Previdência. Mas não poderá tirar investimentos do papel, os quais são considerados essenciais para girar a economia e dar fôlego à sua eventual candidatura à reeleição. Em resposta, Lula ameaçou, na quarta-feira, responsabilizar publicamente a oposição por ¿paralisar o crescimento do país¿, caso inviabilize a aprovação do Orçamento este ano.

¿ Se isso acontecer por interesse eleitoral, será uma irresponsabilidade. Vamos ter que denunciar a oposição por prejudicar o país, por tentar paralisar o crescimento ¿ teria dito Lula de acordo com interlocutores peemedebistas presentes à reunião com o presidente.

Um dia depois de participar de reunião no Palácio do Planalto para tratar do assunto, o líder do PMDB no Senado, Ney Suassuna (PB), disse ontem que o Orçamento será votado somente depois de 10 de janeiro. Ele acrescentou que nem mesmo o anúncio da liberação de R$ 1,1 bilhão em emendas parlamentares será capaz de mudar o quadro.

O motivo seria a resistência da oposição, já informada ao presidente do Congresso, Renan Calheiros (PMDB-AL). Na reunião de anteontem, Renan passou adiante o caso. Disse a Lula que será ¿difícil¿ aprovar o Orçamento.

Participaram do encontro, além de Renan, o ex-presidente José Sarney (PMDB-AP), os ministros Hélio Costa (Comunicações), Saraiva Felipe (Saúde) e Silas Rondeau (Minas e Energia) e o líder no Senado, Ney Suassuna (PB).

O ministro das Relações Institucionais, Jaques Wagner, confirmou que a aprovação do Orçamento é o objetivo central do governo no Congresso e que vem encontrando resistências da oposição.

¿ Estou conversando com os líderes de todas as bancadas para demonstrar que o interesse do país é o limite para a disputa política ¿ disse.

Afinal, líderes do PSDB e do PFL já deixaram claro que votarão o projeto apenas em 2006 para impor nova derrota política ao presidente e atrapalhar seus planos eleitorais. Como a tramitação da proposta orçamentária depende de acordo, são remotas as chances do plano oposicionista naufragar.

¿ Há um claro ingrediente político ¿ afirma um tucano de vistosa plumagem.

De público, PSDB e PFL anunciarão obstrução pautados em uma justificativa mais republicana. Alegarão, por exemplo, que o Orçamento da União de 2006 tem de prever um ressarcimento adequado às unidades da federação pelo fim da cobrança de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) nas exportações, nó que já amarrou a tramitação de orçamentos em anos anteriores. Também cobrarão o repasse aos municípios de 23,5%, em vez dos 22,5% atuais, da arrecadação dos impostos de Renda (IR) e sobre Produtos Industrializados (IPI).

Mais ¿problemas técnicos¿ poderão se levantados caso os anteriores sejam resolvidos, a fim de garantir a votação apenas em 2006. Há duas semanas, o Jornal do Brasil antecipou que o governo liberaria emendas parlamentares a fim de viabilizar a aprovação da lei orçamentária ainda neste ano. Fazia parte da estratégia, definida em reunião no Planalto, contemplar parlamentares da oposição, cooptando-os por meio de agrados a suas respectivas bases eleitorais. O dinheiro chegou, por exemplo, a senadores do PSDB. Eles agradecem o afago, mas anunciam que não mudarão de posição.

Desde novembro, quando detectou dificuldades em torno do Orçamento, Lula repisa em audiências com aliados que o projeto não pode ser alvo de disputa política, tal qual ocorreu quando o PT levou o então presidente Fernando Henrique Cardoso a iniciar um ano de trabalho sem lei orçamentária.