Valor Econômico, v. 20, n. 4979, 11/04/2020. Brasil, p. A4

Efeito no emprego deve ser forte, similar ao de outros países

Arícia Martins 


O mercado de trabalho brasileiro sofrerá efeitos negativos similares aos já vistos em outros países em razão da pandemia de coronavírus, avalia o Bradesco. Em relatório, os economistas Thiago Angelis e Fernando Honorato Barbosa afirmam que, mesmo com as medidas de sustentação de ocupação e renda, o impacto sobre o nível de emprego será relevante. Comércio, serviços, transporte e turismo devem ser os setores mais afetados no curto prazo.

Segundo o Ministério da Economia, sem qualquer intervenção, o Brasil poderia perder até 12 milhões de postos de trabalho. Ainda pelas  projeções oficiais, iniciativas como a Medida Provisória 936 - que permite a redução de salário e jornada e a suspensão do contrato de trabalho -, e o auxílio emergencial de R$ 600 a informais e microempreendedores individuais reduziriam o total de empregos perdidos a cerca de 3,2 milhões.

Assumindo que o percentual de pessoas empregadas e procurando emprego em relação à população em idade ativa (taxa de participação) vai seguir perto dos atuais 62%, o Bradesco calcula que esse volume de demissões elevaria a taxa de desemprego em cerca de três pontos percentuais. No trimestre móvel encerrado em fevereiro, os desempregados eram 11,6% da força de trabalho. Se nada fosse feito para minimizar os impactos da crise no mercado, o desemprego saltaria 11 pontos, estima o banco. Isso quase dobraria a taxa atual.

Angelis e Honorato observam que a covid-19 já fez estragos no nível de emprego de outros países, como na China, onde o desemprego subiu um ponto em  menos de um mês. Nos EUA, houve 6,6 milhões de pedidos de auxílio-desemprego na última semana de março e redução líquida de 700 mil ocupações em igual mês, destacam eles.

No Brasil, apontam, o isolamento social atinge a maior parte da população. Citando levantamento da In Loco e da USP a partir de informações do uso de telefones celulares, Angelis e Barbosa notam que a parcela de brasileiros em confinamento subiu de 22% no início de março para quase 60% no último dia do mês.

Na média de São Paulo, Rio, Belo Horizonte, Porto Alegre e Salvador - as cinco maiores capitais, que concentravam quase um quarto dos 94,5 milhões de ocupados no fim de 2019 - o Bradesco nota que o isolamento atingiu 57% das pessoas no fim do mês passado. Essa proporção ficou em 56% na média das demais capitais, e em 58,3% no país.

Em termos setoriais, o impacto não será homogêneo. Comércio e serviços, que dependem mais do componente presencial, e transporte e turismo, que estão naturalmente restritos, devem ser os segmentos mais afetados no curto prazo, dizem Angelis e Honorato.

No médio prazo, a avaliação é que construção civil, parte da indústria, serviços de água e luz, que não têm sofrido restrições diretas, e serviços de comunicação e atividades financeiras, que conseguiram se adaptar em um primeiro momento, terão reduções maiores na ocupação.

“No curtíssimo prazo, o contingente de trabalhadores informais também se coloca como uma dimensão relevante”, acrescentam os economistas. “Empregados sem carteira assinada, microempreendedores individuais e trabalhadores por conta própria não contam com a mesma rede de proteção garantida aos empregados formais e estão naturalmente mais expostos.”

De acordo com o Bradesco, comércio e serviços concentram mais de 60% dos informais, que são mais de 29 milhões no total.