O Globo, n. 32476, 07/07/2022. Política, p. 10

Política cambial sob a ótica dos presidenciáveis

Ana Flávia Pilar


Divergências sobre a política de câmbio separam os principais candidatos à Presidência da República em dois grupos antagônicos. Enquanto Simone Tebet (MDB) e Jair Bolsonaro (PL) apostam em uma política com menos controle sobre as flutuações no preço da moeda brasileira, Ciro Gomes (PDT) e Lula (PT) defendem uma postura mais intervencionista para reduzir a volatilidade do real frente ao dólar. Com a autonomia do Banco Central (BC), entretanto, aprovada no ano passado, uma interferência mais incisiva significaria uma modificação na legislação.

O Brasil adota o regime de câmbio flutuante há mais de 20 anos. Ou seja, os valores são definidos de acordo com a oferta e demanda, sem intervenção do BC no mercado. Cabe ao banco manter a funcionalidade das operações de compra e venda de moeda estrangeira.

As diretrizes divulgadas recentemente pela equipe de Lula indicam a escolha por uma política cambial mais intervencionista. Embora o petista não fale neste período de pré-campanha em revogar a autonomia do BC, o plano de governo aponta para a necessidade de medidas interventoras da autoridade monetária e contradizem as regras atuais. Em jantar com empresários na semana passada, Lula usou o dólar a R$ 4,70 como uma taxa “ideal”. Ontem, a moeda fechou em R$ 5,42.

Simone Tebet, por outro lado, disse, em nota, que o câmbio deve seguir flutuante, com total independência do Banco Central para conduzir a política monetária:

— Vamos trabalhar para assegurar que a autoridade monetária volte a buscar a meta inflacionária. Com estabilidade institucional, não vamos contribuir para uma desvalorização da moeda.

Segundo o cientista político Carlos Pereira, da Fundação Getulio Vargas, a reação do mercado após a aprovação da PEC Eleitoral, com queda na bolsa de valores e aumento do dólar, mostra que, a despeito da discussão sobre intervenção na política cambial, a gestão fiscal deve ser inserida neste debate.

— A aprovação do texto no Senado implicou em uma fuga de capitais, com a desvalorização do real. Ou seja, flutuações na moeda e desvalorização cambial ocorrem muito mais em função de erros da gestão macroeconômica, e de sinalizações de populismo do governo e do Congresso, do que da política cambial.

Ele também diz que, no momento em que o governo consegue passar credibilidade e ter rigidez nas contas públicas, o país fica menos vulnerável a oscilações na moeda. Como exemplo, apesar de o presidente Jair Bolsonaro preservar o câmbio flutuante, mantendo uma diretriz não intervencionista, a abertura dos cofres públicos visando à reeleição trouxe impactos.

— Quando Bolsonaro foi eleito, e até durante sua campanha, ele vendeu uma política amparada em ideais liberais, não intervencionistas. Mas, assim que se viu em apuros e com sua popularidade em queda, não deixou de abrir os cofres públicos para benefícios diretos, com o objetivo de conseguir reverter o desconforto político, mesmo colocando em risco a rigidez fiscal e a estabilidade do real.

Em 2021, Bolsonaro sancionou o novo marco legal do câmbio, que conferiu autonomia ao Banco Central.

 

Já o assessor de assuntos econômicos da campanha de Ciro Gomes (PDT), o economista Mauro Benevides Filho, defende a criação de um comitê para controlar as intervenções do BC no câmbio. Segundo ele, o câmbio permaneceria flexível, mas passaria a ser operacionalizado por um novo grupo de trabalho. Ciro já disse que aprovar a autonomia do Banco Central foi um “assalto”.

O economista diz também que é necessário institucionalizar as decisões de lançamento de swaps cambiais — a forma de o BC aumentar a oferta de dólar no mercado, controlando a subida da taxa.

— Um comitê acompanharia o câmbio e analisaria a variação do dólar quando há efeitos especulativos. Aí, o BC usaria swaps para dar segurança para o mercado de dólar.