Correio Braziliense, n. 21879, 10/02/2023. Política, p. 4

2,5 milhões de irregulares

Victor Correia


O pente-fino no Cadastro Único promovido pelo Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome aponta que 2,5 milhões de pessoas recebem indevidamente o Bolsa Família. A informação foi dada, ontem, pelo ministro Wellington Dias, que também acusou o governo de Jair Bolsonaro de promover um desmonte no sistema de assistência social.

Segundo o levantamento da pasta, alterações feitas pelo governo anterior permitiram fraudes em cadastros de famílias com apenas um membro, que quase dobraram entre 2021 e 2022. “Foi desmantelado o cérebro do Cadastro Único. É como se tivesse uma bagunça para perder o controle”, afirmou Wellington, durante visita à Cozinha Solidária do Sol Nascente, no Distrito Federal, projeto do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST).

“Temos, infelizmente, pessoas com renda elevada, com nove salários mínimos, recebendo o Bolsa Família. E pessoas sem renda, com fome, que não conseguem acessar”, acrescentou.

O Cadastro Único registra as famílias mais vulneráveis, e é utilizado em mais de 30 programas sociais, incluindo o Bolsa Família, Minha Casa Minha Vida e a Merenda Escolar. Uma das principais propostas de Wellington ao assumir a pasta é a reformulação do banco de dados, que será feito em parceria com a Dataprev (Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência Social).

As fraudes estão no radar do governo desde a transição, no final do ano passado. O número de famílias registradas no Cadastro com apenas um membro cresceu de 15%, em 2021, para 26%, em 2022, indicando a possibilidade de irregularidades. Também no ano passado, o Tribunal de Contas da União (TCU) apontou que as mudanças das regras no então Auxílio Brasil facilitaram fraudes. Membros de uma mesma família poderiam, segundo a Corte, se registrar separadamente, recebendo, cada um, o valor integral do programa.

O pente-fino ainda está em andamento, mas deve ser concluído até o final do mês. Um relatório com o resultado do levantamento será entregue ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Conselho

A reformulação do Cadastro Único também foi pauta da reunião do Conselho de Assistência Social (CNAS), que contou com a presença do ministro. Ao discursar no início do encontro, Wellington lastimou que o desmonte de todo o sistema de assistência social da União nos últimos quatro anos.

“O fato é que nós tivemos uma onda que, se pudesse resumir de forma bem simplificada, quebrou propositalmente esse elo de organização do Sistema Único de Assistência Social com o objetivos que a gente ainda está longe de compreender”, frisou o ministro. Sobre o Cadastro, disse que a desestruturação deu-se com “a queima de equipamentos do cérebro” do sistema.

“Ou seja, você não teve mais a condição de, na velocidade adequada reconstruir essa base de dados. Ora, quando você tem isso, o que é que permite? O ‘entrar de qualquer jeito’”, acrescentou.

Para o ministro, mais preocupante do que os casos de fraude é que muitas pessoas necessitadas, que têm direito a receber o Bolsa Família, ficaram de fora do cadastro. O resultado são 33 milhões de pessoas passando fome no Brasil.