Título: Um livro para cada três alunos
Autor: Sergio Martins
Fonte: Jornal do Brasil, 11/12/2005, Caderno B, p. B3

As bibliotecas públicas da Zona Norte do Rio atendem um universo de usuários muito aquém do potencial da região. Chamadas de Bibliotecas Populares, elas são 12 e estão localizadas nos bairros de Dique, Engenho Novo, Grajaú, Ilha do Governador, Irajá, Maré, Méier, Moneró, Olaria, Penha, Rio Comprido e Tijuca. Possuem um acervo total de 147.273 livros, que representam pouco mais de 30% da população escolar - mais de 450 mil estudantes de primeiro e segundo graus, distribuídos em 1.922 escolas, entre particulares, estaduais e municipais. Ou seja, oferecem um livro para cada 3,7 alunos.

A deficiência no número de livros oferecidos fica ainda mais significativa se compararmos o acervo total da região com a população residente na área: 2.353.590 pessoas, dados de 2000, de acordo com o Instituto Pereira Passos, vinculado à Prefeitura do Rio. Neste caso, a média é de um livro para cada 15,9 pessoas - na Zona Oeste chega a 35 pessoas e, na Zona Sul, 5,4.

O acervo das bibliotecas aumentou em 2005 na região, por causa dos livros adquiridos pela Prefeitura na Bienal deste ano, no Riocentro, e no Salão do Livro Infantil e Juvenil, no Museu de Arte Moderna, os dois no Rio, além das doações de uma editora e de particulares. Mas esses livros novos ainda não estão disponíveis nem catalogados pelo Departamento de Documentação e Informação Cultural da Secretaria das Culturas, responsável pela coordenação da rede de bibliotecas e dirigido pelo escritor e acadêmico Antônio Olinto.

A Biblioteca Popular de Irajá até a semana passada era a que atendia o maior número de usuários (44.492), de acordo com dados do relatório de 2005 do departamento. Na atualização das informações deste ano, ainda não computadas - os relatórios somente serão entregues no começo de 2006 -, ela é superada pela da Tijuca, com uma projeção de atendimento a um universo superior a 54 mil pessoas.

Independentemente do acervo e do número de usuários, as seis bibliotecas da Zona Norte visitadas pela reportagem do JB apresentam as mesmas carências e dificuldades enfrentadas pelas das Zonas Sul e Oeste: livros gastos, deficiência de pessoal, desconhecimento do público, até de pessoas que transitam na área, pilhas de livros a serem catalogados e arrumados em salas adjacentes, seções infantis com poucos livros sem mobiliário adequado.

Encontrar a biblioteca de Irajá requer uma certa dose de paciência, pelo menos para quem não é da região. O endereço (Avenida Monsenhor Feliz, 512) não é facilmente identificável, porque fica numa rua paralela, entrando-se por um beco, totalmente escondida. Nas redondezas, ninguém soube informar onde ficava, muitos nunca haviam ouvido falar dela. A diretora, a bibliotecária Edina Guedes Antolin, estava ausente, segundo a secretária, Cláudia Pimenta, numa reunião fora. A biblioteca não abre nos fins de semana e possui um acervo de 11.207 livros, pequeno para o número de usuários:

- O acervo está aquém do número de usuários (cerca de 44 mil) porque temos enfrentado muita inadimplência (não devolução dos livros). Além disso, independentemente dos nossos esforços para recuperá-los, muitos livros podem ser considerados perdidos. Não temos como pressionar o usuário, até porque muitos mudam de endereço e não nos avisam - explica Cláudia Pimenta.

Instalada no nº 734 da Rua Leopoldina Rego, ao lado da linha de trem, a biblioteca da Penha está a 18 degraus da calçada, sem rampa para deficientes. A diretora, a bibliotecária Ana Cristina Pinto, estava ausente. Tem três funcionários e abre nos fins de semana, das 10 às 16 horas. A Biblioteca de Olaria fica exatamente na divisa com o bairro de Ramos, na Rua Uranos, 1.230. A casa onde está instalada tem também muitas salas para atendimento ao público por outros departamentos da Prefeitura. Apenas dois dos seis funcionários - sendo quatro bibliotecários, entre eles a diretora, Regina Helena Amaral - estavam presentes. Não abre nos fins de semana. Assim como a do Méier, que conta com quatro funcionários e está instalada numa casa bem no coração do bairro, na Rua Castro Alves, 155.

Mesmo em obras - recebeu nova pintura -, a Biblioteca da Ilha é a que mais se aproxima das recomendações do Manifesto da Unesco - documento orientador distribuído aos governos de todo o mundo sobre bibliotecas públicas. Rampa de acesso, espaços amplos e computadores. Está localizada na praça Denaides, s/nº, no Aterro de Cocotá, e abre nos fins de semana. Ainda assim, a secretária Margareth Gomes (a diretora, a bibliotecária Deolinda Mello, está de férias) tem muitas queixas:

- Temos enfrentado furto de livros, inadimplência e muitas outras dificuldades. Somos somente seis funcionários para atender, em épocas de pico, mais de 150 usuários por dia.

O recorde de atendimento pertence hoje à Biblioteca da Tijuca. Localizada na casa 61 da Rua Guapeni, uma rua de paralelepípedos a dois quarteirões da Praça Saens Peña, ultrapassou o número de 50 mil usuários/ano. A secretária Avany Assis (a diretora Josefa Moutinho está de férias) disse que não tem enfrentado problemas de furto nem de inadimplência:

- Somos apenas quatro funcionários. Abrimos também nos fins de semana. Mas o melhor de tudo é que contamos com o apoio da comunidade, inclusive dos moradores do Salgueiro.