Correio Braziliense, n. 21883, 14/02/2023. Política, p. 5
PEC quer militar despolitizado
Ândrea Malcher
Deputados do PT trabalham em uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que obrigue militares que desejem ocupar cargos públicos, mesmo temporariamente, para a reserva da força à qual pertence. A minuta aborda, ainda, modificações no dispositivo de decretação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) — operação de policiamento realizada por Exército, Marinha e Aeronáutica de forma provisória até o restabelecimento da normalidade da lei e da ordem pública.
De autoria dos deputados Alencar Santana (PT-SP) e Carlos Zarattini (PT-SP), o objetivo da PEC é manter o militares longe da política. “As Forças Armadas estão a serviço do povo e do Estado brasileiro, e devem exercer suas atribuições constitucionais de forma apartidária, sendo vedado o uso do cargo, função ou arma para qualquer intervenção política”, destaca o texto da proposta.
Ao ser questionado se a minuta foi motivada pelos atos de terrorismo de 8 de janeiro, Santana afirmou que a mudança “é necessária para deixar cada um no seu quadrado”.
Desde que assumiu a Presidência, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem afirmado que o militar que deseje entrar para a política ou para a gestão pública deve aposentar a farda. A PEC pretende inverter a lógica do governo Bolsonaro, que colocou mais de 6 mil militares em cargos no Poder Executivo.
Caso Pazuello
O governo quer evitar, ainda, episódios como o do hoje general da reserva Eduardo Pazuello — que foi nomeado ministro da Saúde enquanto era da ativa, recebia salário como militar e ainda participou de um ato da campanha à reeleição do ex-presidente, no Rio de Janeiro. Ele deixou a ativa pouco antes de decidir disputar as eleições de outubro passado, quando elegeu-se deputado federal pelo PL-RJ.
A tentativa do governo de despolitizar as Forças Armadas tem relação direta, também, com os militares da ativa identificados entre os vândalos que depredaram as sedes dos Três Poderes. Também pesa a favor da PEC a tolerância do Exército com os acampamentos golpistas que se formaram logo depois da vitória de Lula, em 30 de outubro.
Outro ponto abordado pelo texto da PEC são as operações de GLO. A ideia é alterar o artigo 142 da Constituição, que dispõe sobre as atribuições das Forças. Atualmente, qualquer dos Três Poderes pode acionar militares para a “garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”.
Os bolsonaristas vinham se aprovfeitando de uma interpretação feita pelo jurista Ives Gandra Martins de que o artigo 142 faria das Forças Armadas uma espécie de poder moderador — o que justificaria um golpe de Estado do ex-presidente apoiado pelos militares.
O texto modificaria a responsabilidade das Forças para “assegurar a independência e a soberania do país e integridade do seu território” e poderiam, ainda, ser “escaladas por designação do Presidente da República, nos termos da lei, para colaborar em missões de defesa civil”.