Valor Econômico, v. 20, n. 4981, 15/04/2020. Brasil, p. A3

Em cenário de incerteza, meta fiscal de 2021 pode ter componente variável

Fabio Graner


A equipe econômica finaliza os termos da próxima Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) em meio a uma enorme dificuldade de traçar um cenário para a economia e as contas públicas para os próximos meses e para 2021. Essa dificuldade de se estabelecer um cenário fiscal levou o governo a pensar numa referência de meta fiscal que se adapte à instabilidade macroeconômica, ou seja, ela pode ter um componente variável.

Esse caminho seria uma inovação. Embora ainda possa mudar e voltar ao formato tradicional, a tendência caminhava para essa direção de ter algum fator de ajuste. Alguns integrantes do governo ainda defendem o modelo tradicional, com uma meta fixa de déficit alto o suficiente para acomodar os riscos fiscais à frente.

O grande problema para fechar a peça que referencia a elaboração do Orçamento do próximo ano é que ninguém sabe ao certo o tamanho do tombo que a economia terá em 2020 e, tampouco, a velocidade de recuperação após o fundo do poço.

O desempenho do Produto Interno Bruto (PIB) é peça-chave para as contas públicas. Em uma conta simplificada, cada um ponto percentual a menos nessa variável neste ano implica uma perda, grosso modo, da ordem de R$ 10 bilhões para 2021.

Hoje, o cenário básico oficial é de PIB zero, embora ninguém mais acredite nisso - nem o governo. Os cenários mais pessimistas já apontam queda maior que 5%. Ou seja, em um cenário desses, de largada, o próximo ano já pode começar devendo mais de R$ 50 bilhões em arrecadação.

No cenário da LDO, não deverá haver mudança nessa estimativa de PIB zero, segundo uma fonte. A explicação é que, qualquer número agora é chute, dado o tamanho da incerteza. “Alguém sabe quando vai acabar a quarentena em São Paulo ou no Rio?”, questionou a fonte, apontando que esses Estados têm enorme peso no PIB. “Vamos esperar ter mais dados e atualizar o cenário no relatório bimestral de maio.”

A atual LDO, que referenciou o Orçamento de 2020, indicava para o ano que vem uma meta de déficit de R$ 68,5 bilhões. Em entrevista ao Valor na semana passada, o secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues, admitiu que esse objetivo seria modificado para pior, mas não entrou em detalhes sobre números ou sobre como seria o desenho da LDO.

Ele apenas reconheceu que o grande problema seria a previsão de receitas, em um cenário econômico tão incerto, dado que pelo lado das despesas, o teto de gastos já direciona o tamanho das despesas. Nesse lado da equação, contudo, também há um grau de incerteza, dado que o governo tem tido que lançar mão de créditos extraordinários para ampliar seus gastos no combate ao coronavírus e seus efeitos econômicos, o que tem risco de acontecer no ano que vem também, se a crise se alongar.

Legalmente, o governo tem que enviar o projeto de lei ao Congresso até o fim do dia de hoje (15 de abril). E em tese, cabe ao Parlamento votar essa proposta até meados de julho, marcando o início do recesso de deputados e senadores. Mas com frequência a discussão dessa matéria ultrapassa o prazo legal e o Orçamento é elaborado e apresentado com base no texto originalmente proposto pelo governo.