Valor Econômico, v. 20, n. 4981,
15/04/2020. Política, p. A7
Estados fazem planos de contingência
Malu Delgado
André Guilherme Vieira
Na pressão pela liberação de recursos do governo federal para combater o avanço
da covid-19, os governadores têm anunciado programas de contingenciamento de
gastos e controle fiscal. No momento em que está sob análise do Senado o pacote
de socorro emergencial a Estados e municípios - ainda que com
restrições da equipe econômica e possibilidade de veto do presidente Jair
Bolsonaro - a preocupação de boa parte dos governadores é demonstrar que mesmo
na pandemia e com perdas brutais de arrecadação não haverá descontrole
orçamentário e irresponsabilidade fiscal.
Ao fazer sua coletiva diária ontem,
para anunciar medidas de combate ao coronavírus, o governador de São
Paulo, João Doria (PSDB), mais uma vez aproveitou a ocasião para se contrapor a
Bolsonaro. Doria agradeceu aos 431 deputados federais que votaram a favor do
plano emergencial de socorro a Estados e municípios, apelidado de “novo Plano
Mansueto”. Esse pacote terá impacto fiscal de R$ 89,6 bilhões e lideranças
do governo já sinalizaram que poderá haver veto se o texto não for
modificado no Senado.
“Quatrocentos e trinta e um
deputados que votaram favoravelmente ao projeto de lei que apoia Estados e
municípios”, disse Doria, acrescentando que os 70 deputados que votaram contra
o projeto “curiosamente são parlamentares vinculados ao governo do presidente
Jair Bolsonaro”. Doria disse ter “convicção” de que o Senado
“cumprirá esse mesmo papel”. “Os senadores terão ato humanitário para
reconhecer a gravidade desta pandemia”, afirmou.
Também cotado para a disputa
presidencial de 2022, o governador do Maranhão, Flavio Dino (PCdoB), comemorou
a aprovação do projeto na Câmara. Segundo ele, a medida “permitirá o
funcionamento dos serviços públicos essenciais mantidos por Estados e Municípios”.
“O Senado agora tem um papel de enorme importância. Trabalhando juntos, vamos
vencer essa terrível crise que ameaça o Brasil”, disse, em postagem no Twitter.
Doria detalhou o pacote de redução
média de 20% das despesas de custeio na administração estadual, o que vai gerar
uma reserva de caixa de R$ 2,3 bilhões nos próximos três meses. O governo
paulista não fará antecipação do pagamento de décimo-terceiro neste ano e
suspendeu concursos e nomeações em todas as áreas, à exceção de saúde e
segurança pública. São Paulo quer ainda interromper o pagamento de dívidas
bancárias e de precatórios durante a crise, mas essas medidas estão em
negociação.
São Paulo, de abril a junho, terá
uma queda de arrecadação de receitas da ordem de R$ 10 bilhões, anunciou.
“Precisamos guardar e separar recursos para a saúde e segurança pública neste
momento.”
O vice-governador, Rodrigo Garcia,
reiterou a necessidade de medidas de austeridade fiscal exatamente para
ter maiores condições financeiras de investir no setor da saúde. Mensalmente,
mostrou, São Paulo tem R$ 12 bilhões em despesas. Se nenhuma medida de corte
fosse implementada, salientou, o Estado chegaria com déficit de R$ 4 bilhões em
junho. Garcia esclareceu que reajustes salariais e concessão de bônus
foram suspensos, mas esclareceu que cortes salariais de concursados só
poderão ser feitos com anuência do governo federal. Doria, por enquanto,
descarta a possibilidade de corte de salários de servidores.
“O corte de custeio está ocorrendo
por efeito da própria paralisação de serviços públicos. Fora isso, cortar
custeio neste momento equivaleria a cortar serviços públicos essenciais”, disse
Dino ao Valor. O maranhense determinou a revisão de todo o planejamento
orçamentário por conta da pandemia. Pelos cálculos preliminares, o Maranhão vai
perder R$ milhões em receita, com aumento de despesa de R$ 181 milhões.
Já no Piauí, o governador Wellington
Dias (PT) divulgou ontem uma série de medidas “para garantir o equilíbrio
fiscal no período de calamidade pública”. A estimativa é de redução em 2,2% das
receitas correntes líquidas, com um “caixa” de R$ 220 milhões com o corte de
despesas.
A exceção, como em São Paulo, são os
profissionais de saúde, segurança pública e assistência social. Todos os
servidores estaduais tiveram corte de 50% das indenizações de transporte. O
adicional de férias de servidores relativo este ano só será pago em dezembro.
Promoções, reajustes e indenizações estão suspensos enquanto durar a pandemia.
Ex-aliado de Bolsonaro, o governador
de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM), também publicou no Diário Oficial, na
segunda-feira, o seu “plano de contingenciamento de gastos para o enfrentamento
da pandemia”. Caiado pretende, nos próximos dias, anunciar um acordo com todos
os Poderes (Legislativo, Judiciário e Executivo) para redução de custos
em 30%. Esse era o percentual proposto inicialmente, mas ainda não há
acordo. Segundo o governador, em apenas nove dias o Estado de Goiás já perdeu
mais de 32% de arrecadação de ICMS.
O decreto goiano veda novos
contratos da administração pública direta e autarquias, e barra contratações de
terceirizados. “Somente a Secretaria de Saúde está fora da proibição”,
informou a assessoria do governador. Gastos com passagens aéreas, diárias,
locação de imóveis foram proibidos. Todas as pastas terão que cortar 50% em
gastos de almoxarifado e 30% em custeio.
Outro exemplo de contenção de gastos
foi o Ceará. Com uma projeção de queda de 30% da arrecadação, o governador
Camilo Santana (PT) fez um decreto estadual, no dia 8, com um pacote de redução
de gastos. A projeção é economia de R$ 100 milhões.
Na Bahia, o governador Rui Costa
(PT) deve fazer hoje reunião com os Poderes
no Estado para determinar medidas de contenção. Ele pede apoio do Congresso ao
projeto aprovado pela Câmara e enfrentamento ao Planalto. “O Congresso deve
derrubar o veto se isso acontecer. Os deputados e senadores, sensíveis às
causas do povo, à causa dos municípios e dos Estados, com certeza, nós vamos
trabalhar com cada senador e cada deputado para derrubar o veto.”