Título: Opção pelo conservadorismo
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Fonte: Jornal do Brasil, 15/12/2005, Economia & Negócios, p. A17

O conservadorismo falou mais forte na reunião de ontem do Comitê de Política Monetária (Copom) e os diretores do Banco Central optaram pelo corte de 0,5 ponto percentual na taxa básica de juros (Selic), reduzindo-a para 18% ao ano. Opção que não era consenso no mercado, o corte gradual, como tem dito e repetido a equipe econômica, também não foi ponto pacífico para os integrantes do comitê ontem e dois deles votaram por uma redução maior, de 0,75 ponto percentual. O corte de 0,5 ponto, considerado tímido por integrantes do setor produtivo e do próprio mercado financeiro, venceu por 6 a 2 na última reunião do ano. A decisão, que acabou saindo mais tarde do que de costume - era mais de 20h30 quando o Banco Central divulgou a taxa que vai vigorar até janeiro - demonstra que os integrantes do BC resistiram às pressões externas, sobretudo as que vêm do Palácio do Planalto.

Ontem, o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, afirmou que o presidente tem conversado com freqüência sobre o assunto com o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, e o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, e questionou o que considera ser uma ''excessiva independência'' do BC e do Conselho Monetário Nacional (CMN), que hoje decide o valor da Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP, referência para os empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), atualmente em 9,75% ao ano.

- Vocês têm visto o ministro Meirelles no Palácio. Palocci está quase todos os dias no Palácio. Paulo Bernardo também. O presidente tem conversado constantemente com essas autoridades e monitora esses dados - disse o ministro.

Marinho tem afirmado repetidas vezes nessa semana que os resultados da economia em 2006 dependem das decisões do Copom e do CMN sobre Selic e TJLP agora no final do ano. E insiste que a pressão dos ministros, e agora do presidente da República, não implicará mudança de rumo da política econômica do governo.

- A política econômica continuará sendo administrada de forma segura. O presidente Lula tem dito isso. Não adotará nenhuma medida irresponsável de mudança na política econômica, como alguns desejam. Isso não ocorrerá - reforçou.

Marinho defendeu que os cortes na TJLP e na Selic, aliados à antecipação no pagamento ao Fundo Monetário Internacional (FMI) serão suficientes para assegurar os investimentos futuros e, em conseqüência, o crescimento econômico em 2006.

As pressões sobre o BC cresceram especialmente após a divulgação da retração de 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB, soma de todas as riquezas geradas no país) no terceiro trimestre. A expectativa, após os números negativos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) era de que houvesse uma aceleração dos cortes de juros, como forma de retomada da atividade econômica no último trimestre do ano. A ata da reunião do Copom em novembro, no entanto, representou uma ducha de água fria, devido ao tom ainda cauteloso diante da inflação.

Para o economista-chefe da RC Consultores, Marcel Pereira, o BC tinha todos os fatores que permitiriam um corte de 0,75 ponto.

- O resultado pífio do PIB no terceiro trimestre, uma aceleração abaixo das expectativas iniciais na expansão da atividade industrial e do comércio varejista neste fim de ano levavam a uma perspectiva otimista. Não há explicações que justificassem uma postura conservadora - avalia. - É frustrante.

A decisão do Copom não foi suficiente para animar os representantes do setor produtivo, que consideraram a ação do BC ''conservadora''.

- O presente de Natal ficou para o próximo ano. A redução de 0,5% da Selic não anima a indústria, ao contrário, decepciona - afirmou Boris Tabacof, do Ciesp (Centro das Indústrias do Estado de São Paulo).

Já o economista Julio Gomes de Almeida, diretor-executivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), viu no corte um sinal de que ''o governo acredita que há um piso para o juro real''.

O presidente da Fecomercio, Abram Szajman, sustenta que há espaço para uma queda maior da Selic. Diz acreditar que a disputa dentro do próprio governo, que evidencia duas visões diferentes sobre a condução da política econômica, especialmente sobre o superávit primário, provoca ruídos e inibe uma redução maior dos juros.

Com Karla Correia