O Globo, n. 32500, 31/07/2022. Brasil, p. 13

Juntos e mais espertos

Bruno Alfano


A proximidade entre professores e alunos que faltou em 2020 e 2021, quando a pandemia impôs ensino à distância e isolamento, mostra que pode fazer toda a diferença. Os primeiros resultados do primeiro semestre com volta integral às salas de aula em 2022 são otimistas. Sobretudo, nas redes municipais que adotaram planos e estratégias para recuperar o tempo perdido e monitoram o desempenho dos alunos para garantir a esperada volta por cima. Em Caruaru, Pernambuco, para não haver risco de alguém ficar para trás, foi criado o “alfabetômetro”, que informa quantas são as crianças que, após a devastação da Covid-19, ainda não sabem ler ou escrever.

Em Ubá, Minas Gerais, a aposta em professores de apoio — um profissional a mais em sala de aula — conduziu as turmas do segundo ano do ensino fundamental a um índice surpreendente: 93% dos alunos apresentaram nível de aprendizagem médio ou alto em matemática neste primeiro semestre. No ano passado, o mesmo desempenho só era alcançado por 30% dos estudantes. Em língua portuguesa, a proporção de crianças na mesma etapa escolar com desempenho equivalente passou de 10% para 68%.

— Além da contratação de 270 professores de apoio (um crescimento de 30% de docentes na rede), fizemos um planejamento pedagógico com acompanhamento semanal e promovemos muitas capacitações — conta o secretário de Educação da cidade, Samuel Gazolla Lima. As medições de Ubá foram feitas em parceria com pesquisadores do Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação (CAEd) da Universidade Federal de Juiz de Fora. A escala tem parâmetros para níveis muito baixo, baixo, médio e alto. OCA Edé hoje um dos principais pontos de apoio para redes municipais e estaduais avaliarem o desenvolvimento dos alunos após os abalos da pandemia. Hoje, ele auxilia 10 estados e 20 municípios, além de fornecer uma plataforma para o Ministério da Educação que tem 5 milhões de alunos cadastrados e está disponível para qualquer professor.

— Dá para fazer a avaliação da rede, da escola ou da turma. Com ela, é possível organizar estratégias de agrupamento. Ou seja, o professor junta alunos não por idade ou por etapa escolar, mas por deficiência de aprendizagem —afirma Nara Salles, pesquisadora do CAEd, responsável pelos projetos em parceria com o MEC.

“Alfabetômetro”

A rede de Caruaru, em Pernambuco, também tem acompanhado o desempenho de seus alunos com apoio técnico do CAEd. Preocupada em garantir que nenhuma criança tivesse a capacidade de ler e escrever prejudicada pela pandemia, foi criado um “alfabetômetro”, que nada mais é do que um painel na sala da secretária municipal de Educação, atualizado acada fim de bimestre coma quantidade de crianças alfabetizadas. Ele mostra, por exemplo, que o ano começou com 48% dos alunos de 3º ano sem dominar as letras. Neste momento, isso já caiu para 30%. No 4º, foi de 35% para 21%.

— A alfabetização é nosso objetivo principal e, com o“alfabetômetro ”, as escolas se animam. Os alunos do 3º e 4º ano foram alfabetizados de forma remota por causa da pandemia. Queremos garantir que eles não fiquem para trás e que os alunos novos saiam do 1º ano já sabendo ler— diz Aline Tibúrcio, secretária de educação de Caruaru. Os benefícios da aula presencial para o desenvolvimento cognitivo dos estudantes da educação básica também foram analisados pelo deputado estadual Renan Ferreirinha (PSD-RJ), que defendeu uma dissertação de mestrado sobre o assunto no curso de Administração Pública da Fundação Getulio Vargas. A pesquisa apontou que os alunos da rede municipal do Rio que voltaram às salas de aula mais cedo em 2021 tiveram uma performance melhor do que os que continuaram no ensino remoto.

A diferença nas notas em português e matemática era de 3 pontos percentuais entre os dois grupos. Na avaliação de Ferreirinha, secretário municipal de Educação do Rio de 2021 até março, alguns fatores precisam ser considerados, como as limitações do ensino remoto, apoios essenciais que as escolas oferecem, inclusive de alimentação, e a convivência com os colegas na aprendizagem.

— Cada vez mais está comprovado que os colegas ajudam no processo de conhecimento — diz Ferreirinha, acrescentando que isso não desqualifica o ensino a distância. — A tecnologia e o ensino remoto têm um papel importante e precisam ser estruturados como complemento. Em Jacundá, no Pará, que tem 58 mil habitantes, foram dois anos de escolas fechadas. Em junho, o município fez a primeira avaliação dos alunos, com apoio do CAEd, e descobriu que o 2º ano tinha nível muito baixo ou baixo em matemática e português.

— Os alunos não puderam fazer a pré-escola nem o 1º ano (por causa da pandemia) e muitos perderam até coordenação motora — contou Mara Corrêa, coordenadora da educação básica. — Mesmo assim, nestes seis meses de aula, vimos avanços significativos, especialmente do 3º ao 9º ano.