Título: João Paulo na fila da 'pizzaria'
Autor: Renata Moura e Mariana Santos
Fonte: Jornal do Brasil, 18/12/2005, País, p. A2

Acusado de ter se beneficiado com saque de R$ 50 mil das contas de Marcos Valério, apontado como operador do mensalão, o petista João Paulo Cunha (SP) tem grandes chances de ser o próximo parlamentar a escapar da cassação no plenário. O forte esquema deflagrado na quarta-feira para poupar a cabeça do deputado Romeu Queiroz (PTB-MG) poderá se repetir nos processos que serão julgados no próximo ano. Soma-se, no caso de João Paulo, o prestígio e a consideração dos parlamentares, adquiridos nos tempos em que exerceu a presidência da Casa. A avaliação é dos integrantes do Conselho de Ética.

Queiroz era acusado de não declarar na Justiça Eleitoral cerca de R$ 350 mil, dinheiro recebido pelo PTB mineiro de uma das agências de publicidade de Marcos Valério. A acusação é semelhante à de outros 11 processos que ainda tramitam no Conselho de Ética ¿ inclusive o de João Paulo. Por ser o primeiro da lista de sacadores a passar pelo julgamento em plenário, o sentimento no Congresso era de que o destino de Queiroz serviria de termômetro.

¿ A sobrevivência de Romeu, mesmo com a indicação da cassação pelo conselho, mostra que articulações políticas vão contar e muito nas decisões do plenário ¿ afirmou um dos integrantes do Conselho de Ética.

Além da bancada mineira na Câmara, trabalharam para salvar o mandato de Romeu Queiroz seus correligionários do PTB, inclusive o ministro do Turismo, Walfrido Mares Guia, além de integrantes do PT, PL e PP ¿ partidos envolvidos com as denúncias de mensalão. Participaram ainda das articulações pró-Romeu o governador de Minas Gerais, Aécio Neves (PSDB) e representantes do PFL. Estes últimos, na defesa do deputado Roberto Brant (PFL-MG), que também está na lista dos acusados por quebra de decoro.

Para o presidente nacional do PPS e pré-candidato a presidente, deputado Roberto Freire (PE), o suposto acordão cria ainda mais problemas para iniciar o processo de recuperação da imagem da Câmara e de superação da crise política que assombra o Palácio do Planalto.

¿ Não pense Lula que está fora disso, pois o que aconteceu aqui terá reflexos em cima dele ¿ avaliou.

A absolvição de Queiroz, no entanto, não tranqüilizou completamente os petistas. Há ainda quem aposte em uma possível perseguição aos cinco deputados do PT que respondem processo no Conselho de Ética. A oposição teria interesses em se unir para jogar o ônus das condenações sobre o partido do presidente Lula, e usar os ganhos políticos na campanha de 2006.

Nos corredores da Casa, há quem já questione se as cassações de dois ícones da crise ¿ os ex-deputados Roberto Jefferson (PTB-RJ) e José Dirceu (PT-SP) ¿ seriam o suficiente para matar a sede de justiça da sociedade.

¿ Todos deveriam ser condenados por um deslize imperdoável: a prática de caixa dois ¿ defende Nelson Trad (PMDB-MS), relator do processo contra Roberto Brant (PFL-MG).

Para o deputado Sigmaringa Seixas (PT-DF), a cassação de José Dirceu foi uma decisão política com o intuito de ¿impor uma derrota ao governo¿. Segundo o parlamentar, aliado do Palácio do Planalto, os julgamentos estão sendo pautados pelos interesses políticos, e não a conduta ética em si.

Brant deve ser o próximo a enfrentar julgamento no Conselho, seguido de João Paulo Cunha, Pedro Henry (PP-MT), Pedro Corrêa (PP-PE) e Professor Luizinho (PT-SP). Até o 15 de fevereiro, quando se encerra a convocação extraordinária, o conselho pretende ter concluído todos os depoimentos. A intenção é chegar em março com apenas três pareceres para julgamento.

Para tentar agilizar o processo, vários relatores chegaram a dispensar testemunhas. Carlos Sampaio (PSDB-SP), que dará parecer sobre o caso Pedro Corrêa, conta que seus planos de entregar o relatório ainda este ano foram frustrados devido a uma testemunha que não compareceu: José Janene (PP-PR), que também responde a processo, mas está de licença médica há dois meses.