Título: Amigos, amigos, negócios à parte
Autor: Juliana Rocha
Fonte: Jornal do Brasil, 18/12/2005, País, p. A5

As eleições de 2006 produzirão um divórcio inédito entre o PT e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Depois do estrago político causado pelo uso de caixa dois em 2002 - confessado pelo ex-tesoureiro Delúbio Soares - a campanha para reeleição terá um comitê separado do partido, inclusive com registro diferente no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ).

Lula quer fazer o possível para desvincular sua candidatura dos escândalos que envolveram a legenda, deflagrados neste ano. O presidente e o PT preocupam-se, com razão, com o sumiço das fontes de financiamento para 2006. Afinal, os empresários, que na última campanha presidencial estavam otimistas com a promessa do ''Lulinha Paz e Amor'' e engordaram o caixa do partido, agora têm medo de aparecer na lista de doadores, ainda que seja como financiadores legais e com as notas fiscais em ordem.

Outro objetivo da criação do comitê com CNPJ separado é evitar que os prestadores de serviço que ainda não receberam o dinheiro devido da campanha municipal de 2004, entrem na Justiça para bloquear as contas do PT quando o partido começar a receber financiamento para 2006.

- Já decidimos separar as contas do partido das finanças da campanha presidencial. O mesmo valerá para governadores, deputados e senadores. Quando Lula se apresentar para a reeleição, vai escolher a sua coordenação de campanha independente do PT - destacou o atual tesoureiro da legenda, Paulo Ferreira.

Em 2002, o coordenador de campanha de Lula foi o ex-deputado José Dirceu - cassado em novembro sob acusação de ser operador do esquema do mensalão. Na época, Dirceu também era o presidente do partido. Nas próximas eleições, o atual dirigente do PT, Ricardo Berzoini - que vai tentar a reeleição como deputado federal -, não irá se envolver diretamente na corrida eleitoral de Lula. O presidente está decido a chamar um empresário para cuidar das finanças do comitê.

Mas nem mesmo a presença de um empresário administrando o caixa de campanha de Lula em 2006 não deverá ser suficiente para atrair o mesmo financiamento do passado. O empresariado está desanimado com a corrupção no governo e com medo de ter o nome das empresas envolvidas em escândalos, ainda que tenham feito doações declaradas à Justiça eleitoral e emitido as notas fiscais.

Um líder empresarial que financiou a campanha presidencial nas eleições passadas diz que o partido vai pagar caro no próximo ano. Ele prevê dificuldades para os candidatos petistas ao tentar angariar recursos para disputar as próximas eleições.

- As denúncias de uso do caixa dois criaram um desânimo monumental para toda a sociedade e também para o empresariado. Isso vai ter um preço nas eleições de 2006. Muitas empresas ficarão com medo de se envolver - disse o empresário, que pediu para não ser identificado.

O JB tentou contactar grandes empresas doadoras da campanha passada, questionando se ainda havia disposição para financiar a disputa eleitoral do presidente Lula em 2002. A Marcopolo - empresa do Sul que produz pneus - disse que não queria se pronunciar sobre o assunto. Outras como a Votorantim - que doou R$ 320 mil - e a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) - que doou R$ 250 mil - foram contactadas através das assessorias de imprensa, mas não responderam.

O tesoureiro Paulo Ferreira nega o risco de falta de financiamento e arrisca-se a dizer que a campanha de 2006 será ainda mais cara que a de 2002. Mas interlocutores do partido garantem que há preocupação tanto no PT nacional, quando nos estados.

- O PT e o presidente Lula farão sua maior campanha porque será um ano que envolve a reeleição. O empresariado deve investir na continuidade do nosso projeto de governo, porque criamos condições de estabilidade na economia. Em 2002, acho que investiram até pouco. A campanha do PSDB, do Serra, teve muito mais financiamento - argumenta.

O presidente Lula recebeu R$ 21 milhões em doações de campanha declaradas ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), tanto de pessoas físicas quanto de empresas. O candidato do PSDB nas últimas eleições presidenciais, José Serra, recebeu R$ 28 milhões em doações declaradas à Justiça eleitoral. O tucano entrou em campanha, porém, com o apoio do então presidente, Fernando Henrique Cardoso.

O tesoureiro acrescenta, em seguida, que se o PT tiver dificuldades de financiamento em 2006, será um problema para todos os outros partidos.

- As campanhas são realmente muito caras. É por isso que a reforma política tem que sair - diz.

O líder empresarial acredita que os outros partidos políticos terão menos dificuldade de financiamento em 2006 do que o PT. Ele diz que, apesar do desânimo, o empresariado sabe que tem obrigação de colaborar com campanhas políticas.

- Não se pode olhar para a política com desânimo. O empresariado sabe que tem a obrigação de ajudar no financiamento. Mas a preocupação deve ser de apoiar candidatos corretos. O mais grave desta crise foi a corrupção usada pelo PT, com recursos públicos, para se perpetuar no poder - afirma o empresário.