Título: Morales: ''Vamos tomar o destino nas mãos''
Autor: Sheila Machado
Fonte: Jornal do Brasil, 18/12/2005, Internacional, p. A7

Se Evo Morales se tornar presidente, a Bolívia entra para a história como o primeiro país da América do Sul a eleger um presidente totalmente indígena. O aimará conversou com o semanário americano Newsweek sobre seu possível governo. A Bolívia é uma sociedade racista para os povos indígenas?

Totalmente. Há xenofobia, discriminação, exclusão. Eles nos consideram quase como se fôssemos animais selvagens. Agora estamos dizendo à classe média, aos ricos e aos empresários que também temos direitos.

Você vai parar a erradicação do cultivo da coca se eleito?

Quero um acordo ou uma parceria com os Estados Unidos para conseguir índice zero de tráfico. Não coca zero, mas zero cocaína. Cocaína e o narcotráfico não são parte da cultura andina. Mas a folha de coca é. A Organização Mundial de Saúde estudou a planta e diz que é segura. A coca pode ser industrializada e utilizada sem perigo.

Algumas autoridades americanas dizem que sua campanha tem apoio financeiro do presidente da Venezuela, Hugo Chávez. É verdade?

As pessoas na Casa Branca que dizem isso são tolas. Primeiro, me acusam de ser narcotraficante, narcoterrorista e aliado da guerrilha Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia. É ridículo. Me criticam por receber um prêmio de direitos humanos da Líbia. No ano anterior, tinha sido dado para o Nelson Mandela, e todos respeitam o Mandela. Agora, me acusam de aceitar dinheiro de Cuba, de Chávez. É totalmente falso. O capital mais valioso que Evo Morales tem é sua honestidade e transparência.

Que tipo de relacionamento o governo de Morales vai ter com o setor privado, especialmente o de energia?

Não estou falando em expulsar as companhias de gás. Mas também não significa que vão ficar com nossas reservas. Vamos naturalizá-las. Os contratos com as empresas serão modificados para deixar claro que elas devem responder aos bolivianos. Se as petroleiras quiserem investir aqui, que sejam bem-vindas. Mas nenhuma vai operar sem pagar impostos. Precisamos melhorar a lei de hidrocarbonetos para que beneficie o Estado enquanto permita que as companhias recuperem os investimentos.

O que precisa ser feito para impulsionar os direitos indígenas na região?

Os povos indígenas devem se tornar atores de seu desenvolvimento, da política de seus países. É uma chance essencial para a história da América Latina. Devemos estar no centro de qualquer esforço para obter justiça, igualdade e paz social na região. Estamos cansados de promessas, queremos tomar o destino em nossas mãos.