Título: Dinheiro liberado faz Câmara andar
Autor: Paulo de Tarso Lyra
Fonte: Jornal do Brasil, 17/11/2004, País, p. A-3

Com parte das emendas garantida, deputados começam a votar hoje medidas provisórias para destrancar a pauta A agonia da paralisia nas votações da Câmara pode terminar hoje. Está prevista a publicação no Diário Oficial de uma portaria do Ministério da Fazenda liberando R$ 260 milhões em emendas parlamentares. Outros R$ 168 milhões do Ministério da Saúde também serão liberados para o mesmo fim. Enquanto isso, o presidente João Paulo Cunha (PT-SP) realiza uma reunião com todos os líderes da Casa para discutir o mérito das 23 medidas provisórias e três projetos de urgência constitucional que trancam a pauta.

- No meu ponto de vista, está esgotado o processo de obstrução - apostou João Paulo.

Por enquanto, é mais uma esperança do que uma certeza. O próprio João Paulo teve ontem um dia agitado. Foi até o Palácio do Planalto conversar com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Na parte da tarde, teve diversas reuniões com líderes aliados. Chegou a interromper uma reunião da bancada do PT - que tratava de Lei de Falências e ProUni - para puxar o líder Arlindo Chinaglia (SP) para um canto, para conversar.

O presidente tentava sorrir para esconder a angústia. Cruzou o corredor das Comissões para conversar com a oposição. Uma longa conversa, de quase uma hora, com pefelistas e tucanos. A intenção inicial era almoçar com José Carlos Aleluia (PFL-BA) e Custódio Mattos (PSDB-MG). O encontro acabou acontecendo apenas no fim da tarde.

A paralisia na Câmara chegou ao limite ontem. A primeira medida provisória da pauta, destinando R$ 86 milhões para o combate à febre aftosa, perdeu a validade sem que fosse votada. Como toda a verba já havia sido utilizada pelos Ministérios da Agricultura e Meio Ambiente, o Congresso terá que editar um decreto-legislativo regulamentando a aplicação destes recursos.

- Nunca, desde que houve mudanças nas regras de tramitação das medidas provisórias, uma MP caducou - confirmou Aleluia.

Mais do que uma questão financeira, os líderes da bancada governista, e até os parlamentares da oposição, têm queixas amargas quanto ao tratamento que vêm recebendo do Executivo. No fim da semana passada, o governo havia empenhado R$ 200 milhões, mas, até ontem, nada constava no Siafi.

- O que eu posso demonstrar, além da minha cara de desolação? - resumiu o vice-líder do governo na Câmara, Beto Albuquerque (PSB-RS).

Petistas demonstravam preocupação com o quadro. Para alguns, começa a haver uma crise de governabilidade. Apostam que a atual crise com o PMDB é a mais grave de todas. Um petista com bom trânsito no Palácio do Planalto começa a temer que a ameaça dos peemedebistas de abandonar o barco não seja apenas um blefe.

- A situação é preocupante. Não digo que estejamos com a luz vermelha. Mas a luz amarela está piscando, forte - definiu.

Até quem não está em obstrução mostrava o seu desconforto. Líder do PSB na Câmara, Renato Casagrande (ES), afirmou que existe um clima muito ruim na relação entre o governo e o Legislativo.

- É fundamental que se crie um ambiente político para retomar as votações - cobrou.

O líder do PP na Câmara, Pedro Henry (MT), está fazendo um levantamento para mostrar a queda brutal de investimentos no Estado desde a chegada de Lula ao poder. Levantamento que será encaminhado ao próprio presidente, em uma carta do líder do PP. Segundo ele, em 2001, Mato Grosso recebeu R$ 185 milhões em investimentos novos; em 2002, esse valor diminuiu para R$ 166 milhões. No primeiro ano do governo Lula (2003), houve uma redução drástica para R$ 45 milhões. Este ano, até o momento, apenas R$ 33 milhões foram investidos no Estado. Para Henry, a equipe econômica petista é muito mais severa que a tucana.

- Estou assustado. Estamos chegando a um ponto de estrangulamento. Não dá para continuar assim - lamentou.

A oposição continua esperando que a base governista se acerte. Em tom de galhofa, o tucano Custódio Mattos (MG), espera que o ''coronel Siafi'' entre em campo para acalmar as tropas governistas. Aleluia apóia a queixa dos aliados, que só retomam as votações após a liberação efetiva das emendas.

- Quem não tem crédito só compra à vista - resumiu.