Correio Braziliense, n. 22535, 28/11/2024. Economia, p. 7

Dólar bate recorde: R$ 5,91
Raphael Pati



O câmbio do dólar norte-americano sentiu o impacto da expectativa crescente em relação ao anúncio do pacote fiscal aguardado desde o último mês de outubro pelo mercado financeiro. Com a informação de que o ministro Fernando Haddad faria um pronunciamento na noite de ontem sobre o pacote que incluiria pontos mais sensíveis ao mercado, como a isenção de IR e a taxação de super-ricos, o dólar disparou 1,8% ao fim do dia e atingiu o valor recorde de R$ 5,91 no fechamento. Foi a maior cotação alcançada pela divisa no Brasil.

A moeda dos EUA abriu o dia em leve alta e logo no início da tarde acelerou com a confirmação de que Haddad faria um pronunciamento durante a noite para anunciar o pacote fiscal. Um dos aspectos que foram adiantados, no entanto, foi a inclusão da isenção do Imposto de Renda (IR) para salários de até R$ 5 mil no rol de medidas que serão levadas ao Congresso Nacional.

Um pouco mais tarde, o ministro do Trabalho e Emprego (MTE), Luiz Marinho, acrescentou que, além do IR, o novo pacote também deve tratar sobre supersalários e taxação de super -ricos. Com isso, os investidores ficaram mais receosos e o câmbio da divisa norte-americana chegou a subir acima de 2%, no valor de R$ 5,92 durante a tarde.

Desvalorização

O real vem perdendo força em relação ao dólar desde o mês passado, diante da expectativa do anúncio do corte das despesas da União, ocorrido na noite de ontem. Em toda a América Latina, a moeda brasileira registrou a segunda pior performance em 2024 e ficou atrás apenas do peso argentino, de acordo com um levantamento da empresa Quantum Finance.

Para o especialista em Mercado da Star Desk, Felipe Sant’Anna, a inclusão de um “jabuti” na proposta de corte de gastos fez com que o mercado ficasse mais receoso na quarta-feira, às vésperas do pronunciamento de Haddad.

“Enquanto os investidores aguardam e clamam por austeridade, o governo abre mão de uma receita fiscal bilionária que poderia ajudar, e muito, as contas públicas. Provavelmente, a notícia do IR é uma estratégia de Lula para amenizar o amargor dos cortes, e deve ganhar destaque nas falas de hoje à noite, ao estilo “o gato subiu no telhado”, avalia Sant’Anna.

Já para o CEO da Hike Capital, Jonas Carvalho, a demora na divulgação do pacote fiscal tem gerado nervosismo entre os investidores, o que causou impacto direto na cotação do dólar. “No  cenário internacional, o dólar apresentou movimentos mistos frente a outras moedas, com investidores aguardando dados econômicos dos Estados Unidos e possíveis ações do Federal Reserve (Fed — Banco Central dos EUA), o que também influenciou o comportamento do câmbio no Brasil”, comenta.

Os impactos no mercado também se refletiram nas ações. O Índice da Bolsa de Valores de São Paulo (Ibovespa/B3) registrou uma das piores quedas diárias do ano, com um recuo de 1,73%, no fechamento do pregão. Papeis de bancos, como Banco do Brasil (BBAS3) (-1,75%,), Itaú (ITUB3) (-2,45%), Bradesco (BBDC4) (-2,7%) e Santander (SANB11) (-3,35%) foram alguns dos mais atingidos.

Emprego

Além da alta recorde do dólar, a economia brasileira registrou a desaceleração de um indicador ontem. Dados publicados pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), do Novo Caged, apontam que mais de 2,2 milhões de admissões por emprego formal foram registradas no Brasil no mês passado. Em contrapartida, houve 2,09 milhões de demissões, o que indica um saldo positivo de 132 mil novas vagas criadas durante o mês. O resultado é o pior da série histórica para outubro desde 2020 e também o mais fraco em todos os meses de 2024.

De janeiro a outubro de 2024, o saldo ultrapassou a marca de 2 milhões de novos empregos formais, com a admissão líquida de 2.117.473 cargos em todo o país. O resultado é melhor do que o registrado no mesmo período em 2023, mas ainda menor do que os saldos obtidos em 2021 e 2022, quando o setor se recuperou após um número maior de demissões em 2020 — ano em que houve o início da pandemia da covid-19.

Para o economista do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV/ Ibre) Rodolpho Tobler, apesar da desaceleração do mercado de trabalho em outubro, há uma tendência de recuperação nos próximos meses, com o tradicional aumento dos empregos temporários de final de ano. “A gente pode ter também algum acréscimo de vagas, com empregos temporários, também, aquecimento temporário de uma determinada parte da economia, como no caso de comércio e uma parte de serviços”, avalia.

Antes do anúncio das medidas de revisão de gastos, o ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, já havia adiantado que o governo não incluiria o seguro-desemprego no pacote fiscal que será enviado ao Congresso. Atualmente, a modalidade garante um benefício de até R$ 2.313,74 para o segurado, a depender do salário que recebia enquanto ainda estava em serviço.