Título: Governo troca acusações com MST
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Fonte: Jornal do Brasil, 23/12/2005, País, p. A4

Um balanço oficial dos números da reforma agrária gerou ontem uma troca de acusações entre o governo e o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), tradicional aliado do PT. Em nota, o Ministério do Desenvolvimento Agrário disse que o MST faz ''crítica leviana'' e busca ''um debate sem nenhuma seriedade, baseado em slogans vazios de conteúdo, informações e argumentos falsificados''. Foi uma resposta a uma nota do movimento, segundo a qual o governo Luiz Inácio Lula da Silva, a exemplo de seu antecessor, o tucano Fernando Henrique Cardoso, ''inflaciona os verdadeiros números de assentamentos utilizando a prática de contabilizar a reposição de lotes em assentamentos antigos como novos e em deixar famílias vivendo em assentamentos precários no Norte do país em terras públicas''.

O ministério anunciou, no início da tarde, que conseguiu assentar neste ano 117.500 famílias superando a meta de 115 mil para 2005. O presidente do Incra, Rolf Hackbart destacou que a gestão Lula foi a que mais rendeu bons frutos no quesito reforma agrária, apontando que, nos 32 anos de Incra que antecederam o Governo Lula, apenas 540 mil famílias foram atendidas.

O ministério também apresentou uma comparação direta com o governo de Fernando Henrique Cardoso: no primeiro mandato de FHC, foram destinados à reforma agrária cerca de 10,8 milhões de hectares. No segundo governo, foram mais 8,8 milhões de hectares. Em três anos, Lula destinou mais de 16,3 milhões de hectares de terras à reforma agrária.

Em seguida, o governo foi acusado pelo MST de reproduzir o comportamento de FHC. Segundo os sem-terra, o ministro Miguel Rossetto comemora uma ''política que não desconcentra a propriedade da terra e não distribui renda, premiando latifúndio e se assemelhando a projetos de colonização da Amazônia no regime militar.''

No início da noite, veio a resposta do ministério, para quem o movimento ''tenta confundir a opinião pública negando as informações'' do ministério e do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária.

''Alheio ao que realmente está acontecendo no campo brasileiro, o MST discorda dos números sem fundamentar sua discordância'', disse o ministério. ''Se o MST não vê, ou não sabe, é porque está longe destas terras e desta gente.'' A maior parte dos assentados deste ano está nas regiões Norte e Nordeste, onde o movimento tem menos penetração.

O ministério termina sua nota dizendo que ''um trabalho não pode ser interrompido nem dificultado pelo debate maniqueísta, pobre e marcado por interesses particulares ou de grupos''.

Mais cedo, em entrevista, Rossetto havia dito que poderia haver divergências conceituais de natureza política.

- Mas, em relação aos números, eles traduzem a realidade do setor - afirmou.

Foi acompanhado pelo presidente do Incra, Rolf Hackbart, que disse não haver ''reforma agrária virtual no governo''. ''Em janeiro vamos divulgar o relatório fechado, com a lista das famílias assentadas, inclusive com CPF delas'', afirmou.

Rossetto reconheceu que há famílias assentadas vivendo em barracas, sem citar números, mas diz que o próximo passo é atendê-las com infra-estrutura.

- Reforma agrária é um processo - completou Hackbart, apontando que o Incra, por exemplo, teve seu Orçamento ampliado de R$ 1,5 bilhão em 2003 para R$ 3,5 bilhões neste ano, além da previsão de contratar 1.771 novos funcionários.

Para o próximo ano, o governo Lula terá de chegar a 400 mil famílias assentadas para cumprir integralmente a meta do PNRA (Plano Nacional de Reforma Agrária). Mesmo superando a previsão neste ano, o governo ainda precisa assentar outras 165 mil famílias em 2006.

Segundo Rossetto, será possível chegar ao previsto, e a definição dos novos índices de produtividade para a desapropriação de terras ajudará nesse processo.