Correio Braziliense, n. 22559, 23/12/2024. Política, p. 3

Legislação reduz saidinhas
Renato Souza



Nesta semana, milhares de presos em todo o país vão deixar as unidades prisionais em razão das chamadas “saidinhas” — benefício em que os presos com bom comportamento ou que já cumpriram a maior parte da pena e estão em regime semiaberto podem deixar a cadeia e conviver com as famílias. O ano de 2024 é o primeiro em que as saídas de fim de ano ocorrem sob critérios mais rígidos, aprovados pelo Congresso Nacional.

A regra foi aprovada pelo Congresso em abril e sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no mesmo mês. Apesar das restrições gerarem polêmica, o governo foi pressionado a validar a lei sob a acusação de que seria visto como responsável pela violência no país. Enquanto parlamentares de direita pressionavam pela sanção na íntegra, políticos e coletivos de esquerda pediam o veto a alguns artigos em razão de políticas carcerária e humanitária. A Câmara chegou a aprovar uma norma que levava ao fim das saidinhas, independentemente dos motivos alegados.

Porém, no Senado, ocorreu substancial alteração no texto e os congressistas permitiram a saída de presos para fins de estudo, seja ensino superior, fundamental ou médio. Quem comete crime hediondo, ou seja, doloso (com intenção), contra a vida, fica proibido de ser beneficiado com a saída temporária. O presidente Lula vetou um artigo que proibia presos de deixarem a cadeia em datas comemorativas para visitar a família. O chefe do Executivo tomou a decisão após ouvir o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski.

“Nós entendemos que a proibição de visita às famílias dos presos que já se encontram no regime semiaberto atenta contra valores fundamentais da Constituição, o princípio da dignidade da pessoa humana, da individualização da pena e na obrigação que tem o Estado de proteger a família”, disse Lewandowski, à época. De acordo com dados estimados pelo Ministério da Justiça, o Brasil tem atualmente cerca de 118 mil presos em regime semiaberto, que poderiam ser beneficiados. Réus primários, ou seja, que cometeram crimes pela primeira vez, podem sair caso tenham cumprido ao menos um sexto da pena. No caso de reincidentes, é necessário ter cumprido um quarto.

Nos estados

Em 2023, 56 mil presos aproveitaram a saidinha no fim de ano no país, sendo que 2,5 mil não retornaram para o cumprimento de pena. A expectativa é de que, neste Natal, ocorra uma redução de 30% no total beneficiado, fazendo com que de 36 mil a 40 mil detentos possam passar este período fora das unidades prisionais.

São Paulo possui a maior massa carcerária do país e, no ano passado, 34 mil pessoas foram contempladas pela saída temporária. No Distrito Federal, 1,9 mil presos devem ser liberados este ano. No Espírito Santo, a Secretaria Estadual de Justiça informou que 2,5 mil detentos vão passar o feriado em casa. No Maranhão, a saidinha beneficia 865 detentos da chamada Grande Ilha, que abrange a capital São Luís, São José de Ribamar, Paço do Lumiar e Raposa.

Cada caso deve ser avaliado individualmente pela Vara de Execuções Penais das unidades da Federação — o que não permite ter um número exato de quantos detentos serão liberados. O Supremo Tribunal Federal (STF) entende que a lei que restringe as saídas temporárias não pode retroagir, pois é considerada gravosa, ou seja, que torna mais rígido o cumprimento da pena.

Benefício

O princípio adotado no Brasil é de que a lei penal não pode retroagir, salvo em benefício do réu. Com isso, a expectativa é de que, nos próximos anos, a alteração legislativa que entrou em vigor neste ano reduza o número de internos beneficiados. Para quem já estava preso antes da lei ser sancionada, ela não pode ser aplicada. As saídas ocorrem geralmente por sete dias, sendo que no final do período o detento deve retornar ao local de cumprimento da pena definida pela Justiça.

Quem não volta é considerado foragido e pode perder o direito de passar datas comemorativas com a família. Em razão da alteração na lei, o Ministério Público também deve ser consultado e pode se manifestar pela saída ou não do interno. A fiscalização fica por conta das Secretaria de Administração Penitenciária de cada localidade.