Título: Espionagem ao alcance de todos
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 27/12/2005, Internacional, p. A7

Quando o site de busca Google lançou o software Google Earth, que torna público o acesso a imagens aéreas e de satélites de todo o mundo, a empresa enfatizou sua utilidade como ferramenta de ensino e o aspecto lúdico do programa, que permite visualizar desde ruas em pequenas cidades à Torre Eiffel, o Big Ben ou as pirâmides do Cairo, por exemplo. Seus criadores só não imaginavam que receberiam queixas de governos, temendo ataques terroristas planejados pelo computador.

Desde o lançamento do programa, em junho, autoridades de vários países disseram-se preocupadas com a veiculação de imagens detalhadas de prédios oficiais, instalações militares e plantas nucleares.

Israel já conseguiu que o Google reduza a resolução das imagens do país, limitando-as a dois metros (o que impediria a visualização em detalhes de portas, placas, acessos ou outras informações estratégicas). O programa mostra, atualmente, fotos de satélite de Jerusalém, Tel Aviv, de Masada, do Centro de Pesquisa Nuclear de Dimona e de Sdot Micha, onde acredita-se estar instalada uma base de armas nucleares.

Na Índia, o governo também afirmou estar preocupado com a divulgação de imagens de instalações estratégicas no país e decidiu formar um grupo de especialistas em segurança para negociar com o Google e estudar mecanismos de proteção.

- O software pode comprometer seriamente a segurança de um país - disse V. S. Ramamurthy, secretário do Departamento de Ciência e Tecnologia indiano.

O professor de estratégia de segurança da Escola Nacional de Guerra de Washington, Bernard Finel, concorda:

- A facilidade com que algumas informações podem ser acessadas é muito perigosa.

O Google Earth disponibiliza imagens do complexo do Parlamento indiano, da residência presidencial e de escritórios do governo em Nova Délhi, o que vai contra uma lei do país. Desde 1967, a Índia proíbe fotos aéreas e de satélites de pontes, portos, refinarias e instalações militares, podendo vetar a divulgação.

- Eles devem pedir nossa autorização - afirmou o inspetor do Exército, major general Gopal Rao, referindo-se ao Google. O site já se dispôs a conversar sobre o assunto.

Queixas parecidas estão refletindo em vários países. Os operadores de um reator nuclear na Austrália reclamaram que o programa faz do local um alvo para terroristas. A Coréia do Sul também fez coro e declarou que teme ataques em suas instalações militares. Já a Tailândia informou que pretende pedir ao Google que bloqueie imagens de prédios oficiais.

Andrew McLaughlin, representante do Google, afirmou que a empresa já começou a negociar com Nova Délhi, especialmente sobre a veiculação de imagens da Caxemira, região disputada com o Paquistão.

O analista de Segurança do Laboratório Nacional de Sandia, em Novo México, sugeriu que a Índia se adapte às novas tecnologias:

- Os tempos estão mudando. Quando se têm olhos múltiplos para o céu, o globo passa a ser ''transparente'', onde qualquer um pode adquirir informações básicas sobre qualquer coisa - afirmou.

O Google Earth adquire as imagens da Digital Globe, uma empresa de Colorado, Estados Unidos, que faz reposição de imagens de satélite. A tecnologia foi desenvolvida para um produto que custaria US$ 79 anuais. Mas o Google lançou o software para download, gratuito.