Título: Petrobras cede a Morales
Autor: Ricardo Rego Monteiro
Fonte: Jornal do Brasil, 01/01/2006, Economia & Negócios, p. A24

Quando assumir a presidência da Bolívia, no próximo dia 22 de janeiro, o candidato eleito Evo Morales terá sobre a mesa um esboço do acordo que a Petrobras apresentará ao governo daquele país para superar o impasse em torno das duas refinarias controladas pela estatal brasileira em Santa Cruz de la Sierra e em Cochabamba. O diretor da Área Internacional da estatal, Nestor Cerveró, revelou para o JB que a estatal boliviana YPFB deverá assumir uma participação societária nas duas unidades que controlava até a decisão de vendê-las para a empresa brasileira no fim da década de 90. Além disso, revelou Cerveró, a empresa boliviana também deverá ser convidada a participar do projeto do novo pólo gás-químico que a Petrobras pretende construir na fronteira com o país andino. Por enquanto, o empreendimento conta com a petroquímica brasileira Braskem, do grupo Odebrecht, e a petroleira hispano-argentina Repsol-YPF. Avaliado em cerca de US$ 2 bilhões, o novo pólo, segundo o executivo, será erguido na fronteira de Corumbá (MS) com a Bolívia e agregará valor ao gás boliviano.

Os acordos sobre as refinarias e o novo pólo gás-químico foram alinhavados a partir de entendimentos já encaminhados pelas diretorias das petroleiras dos dois países. De acordo com Cerveró, o acerto definitivo depende apenas da posse do novo presidente e da definição dos titulares dos ministérios, uma vez que envolverá, do lado brasileiro, a interlocução conjunta do Ministério de Minas e Energia.

O diretor da Petrobras não quis adiantar, no entanto, os percentuais e valores envolvidos nas duas frentes de negociações, mas afastou de forma taxativa qualquer possibilidade de recrudescimento das turbulências vividas naquele país ao longo de 2005. Segundo ele, apesar das ameaças de corte do fornecimento de gás - que chegaram a se materializar em invasões de instalações da empresa na Bolívia por manifestantes - no auge da crise que resultou na deposição do presidente Carlos Mesa, ''nunca chegou a ocorrer um corte do abastecimento de gás para o Brasil''.

As importações brasileiras da Bolívia somam, atualmente, 25 milhões de metros cúbicos de gás natural, por meio do gasoduto Bolívia-Brasil. A despeito de toda crise, que também resultou no encarecimento do insumo importado, Cerveró confirmou que também aproveitará o que classificou de bom momento nas relações entre os dois países para viabilizar em definitivo a expansão do gasoduto.

Atualmente, a capacidade de transporte da unidade está limitada a 34 milhões de metros cúbicos/dia de gás, mas o consumo no Brasil deste insumo chegou a cerca de 50 milhões de metros cúbicos/dia em novembro deste ano. Cerveró afirmou que, qualquer que seja o montante da expansão, a tendência é que o gás importado a partir da nova capacidade chegue mais barato aos consumidores brasileiros.

A Petrobras, segundo ele, deverá absorver ao longo do tempo os repasses dos preços do produto. Cerveró explicou que, para essa parcela do gás, a empresa negociará um contrato diferente do atual, que prevê reajustes trimestrais de preços a partir da variação de uma cesta internacional de óleos. Sem a cláusula do atual contrato, o diretor explicou que a Petrobras poderá adotar o mesmo procedimento dos preços dos derivados de petróleo. Nesse caso, os repasses ocorrem de forma gradual, de modo a não terem impacto sobre a inflação e o bolso dos consumidores.