Título: Aliados reclamam da liberação de emendas
Autor: Sérgio Pardellas, Daniel Pereira e Mariana Santos
Fonte: Jornal do Brasil, 04/01/2006, País, p. A4

A base aliada do governo no Congresso está indignada. O motivo é a suposta falta de critério e o descumprimento de acordos na liberação das emendas parlamentares. Lideranças reclamam que, apesar de ter aberto a torneira no final do ano, o governo não conseguiu honrar seus compromissos. Além disso, a ordem de liberação das verbas em alguns ministérios teria obedecido à vontade dos titulares das pastas, contrariando determinação expressa do próprio Palácio do Planalto. A suspeita principal recai sobre o Ministério das Cidades, que, sob a batuta do ex-presidente da Câmara Severino Cavalcanti (PP-PE), teria montado uma espécie de governo paralelo no que diz respeito ao pagamento das emendas. Embora o órgão seja comandado por Márcio Fortes (PP), Severino atuou em 2005 como se fosse o titular, despachando com prefeitos ligados a seu partido e até mesmo usando garagem e elevadores privativos do ministro. A possível insubordinação já está sendo investigada pelo Planalto.

O ministro da Coordenação Política, Jaques Wagner, está mapeando as emendas empenhadas no apagar das luzes de 2005 para verificar se são procedentes as reclamações de deputados e senadores. Ontem, a chefe da Casa Civil, ministra Dilma Rousseff, declarou que a liberação das emendas leva em consideração a relevância do projeto. Por isso, é possível que uma emenda de um parlamentar cassado seja liberada. Basta ter impacto social ou econômico.

- Pelas reclamações que recebi dos parlamentares do PSB, o ministério das Cidades não cumpriu com o que foi determinado pelo Planalto. Mas pode não ter sido o único. A reclamação é generalizada - disse o líder do PSB na Câmara, Renato Casagrande (ES).

Segundo o deputado, o processo é tumultuado pela ausência de critério do governo, que, pressionado, acaba perdendo o controle sobre as liberações.

- Está claro. Pressionado no fim do ano o governo não tem controle sobre a destinação do dinheiro - acrescentou.

Um líder peso pesado do Senado engrossa o coro dos descontentes. Declarou-se ''perplexo'' com o fato de o governo ter liberado em dezembro emendas de parlamentares da oposição, sem agraciar aliados. Entre eles, os senadores César Borges (PFL-BA) e Demóstenes Torres (PFL-GO) e os deputados Moroni Torgan (PFL-CE) e Eduardo Paes (PSDB-RJ). O líder acusou o governo de desorganização. E prometeu lutar a partir de hoje para reverter o quadro, mesmo que os ministros ainda estejam fora de Brasília, no recesso de fim de ano.

- Ficamos surpresos porque saíram emendas da oposição. O governo não sabe nem quem vota com ele - protestou.

Entoa o mesmo discurso outro líder da Casa. Empenhado em conseguir a liberação das emendas da bancada de seu estado, o senador, que também pediu para não se identificar, disse ter ficado surpreso com a desorganização e o desrespeito de alguns ministros que sequer atendiam as ligações.

- Nunca vi uma bagunça tão grande. A gente tentava falar com o Jaques, com a Dilma, mas não tinha ninguém em Brasília - queixou-se.

Revoltado, ele disse que não foi liberado nem um centavo dos R$ 15 milhões em emendas de sua bancada atreladas ao Ministério das Cidades.

- Foi um horror - resumiu.

Entre os parlamentares da base que não receberam nada na última liberação estão os deputados Isaías Silvestre (PSB-MG), Carlos Abicalil (PT-MT), Fátima Bezerra (PT - RN) e Luiz Bassuma (PT-BA). O Planalto já deixou claro que não será possível cumprir todos os compromissos. A prioridade é a liberação de dinheiro para projetos traçados em conjunto com os ministérios. Segundo um assessor de Lula, a reclamação é de mão dupla.

- Tem líder que não aparece para votar projetos de interesse do governo e fica ligando dos estados para cobrar a liberação das emendas - afirmou.