Título: Escândalo na fila do visto
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 04/01/2006, Internacional, p. A6

A entrevista concedida por um ex-funcionário do Serviço de Imigração londrino ao tablóide sensacionalista The Sun transformou em escândalo sexual denúncias de negligência na extensão de vistos de permanência a imigrantes, o que será investigado pelo governo. Anthony Pamnani, de 23 anos, pediu demissão do maior escritório de atendimento a estrangeiros na capital por não agüentar mais ver seus colegas concederem prazos de permanência longos a mulheres bonitas com quem fizeram sexo e mandarem as ''feias'' para o fim da fila, muitas vezes, com seus pedidos negados. As brasileiras, segundo ele, só precisavam ''sorrir e se debruçar no balcão''.

- Uma menina entrou lá no escritório e nos contou que um funcionário foi a seu apartamento, e eles dormiram juntos. Recebeu visto de permanência sem prazo de vencimento - disse o rapaz.

Em uma outra vez, ouviu de um dos funcionários, que se referia a uma imigrante turca.

- Dei a ela mais que uma extensão de visto, se é que você me entende.

Uma libanesa parece ter acreditado numa falsa promessa de benefício.

- Ela chegou no escritório furiosa, xingando, procurando por um dos 'caras' que trabalhavam lá, mas que tinha sido transferido recentemente para outro departamento. Então, a mulher nos contou que ele tinha prometido lhe dar a extensão de seu visto e que os dois tinham dormido juntos em seu apartamento em Brighton. - contou Pamnani.

Quanto às brasileiras, não hou ve relatos de troca de sexo pelo serviço, mas o rapaz garante que, se um casal ia fazer o mesmo pedido, o homem conseguiria extensão de um ano e a mulher, de dois. Desde que ela sorrise e se debruçasse no balcão.

Ainda segundo o relato de Pamnani, os homens do escritório conhecido em Londres como Lunar House, no bairro de Croydon, chegavam a tirar cópias das fotos das mulheres consideradas ''feias'' e as colavam em uma espécie de mural para fazer piadas grosseiras.

Uma delas:

- Ela é muito horrível, mesmo. Vamos mandá-la de volta.

A entrevista de Anthony Pamnani levou o Ministério do Interior da Grã-Bretanha a abrir uma investigação formal no escritório que recebe cerca de 300 mil pedidos de extensão de vistos todos os anos. Mas não foram só denúncias de favores sexuais que levaram o jovem a, em suas palavras, ''perder o que ainda restava de respeito pelo emprego'' - Pamnani estava há quatro anos no escritório, onde o salário médio é de 17 mil libras por ano.

Além de contar que seus chefes uma vez orientaram a equipe a restringir a permanência de imigrantes da Índia e privilegiar os do Leste Europeu, Pamnani descreveu, ainda, como seus ex-colegas são displicentes ao lidar com os documentos.

- Em muitos casos, os passaportes sequer são examinados para ter certeza que seus donos não foram condenados ou são procurados pelas autoridades de seu país de origem - critica, advertindo que procedimentos tão frouxos podem ter permitido que terroristas entrassem na Grã-Bretanha. - E tudo isso foi por pura preguiça de andar alguns metros para ir ao computador que lê estes dados.

Além disso, os passaportes eram deixados no escritório de Croydon sem nenhum cuidado e poderiam ser facilmente roubados.

- Valeriam uma fortuna no mercado negro - ressalta.

O secretário do Interior, Tony McNulty, prometeu que todas as acusações serão investigadas ''a fundo''.

- É um assunto muito sério - afirmou. - Tenho toda a confiança que nossa equipe, junto à Direção de Imigração e Nacionalidade desempenham suas funções com profissionalismo e integridade. Mas não vou tolerar desvios de comportamento.

O jornal lembrou na reportagem que, em 2003, um repórter do The Sun foi à mesma Lunar House fingindo ser um imigrante ilegal do Leste Europeu, dizendo que perdera seu passaporte. O jornalista deu nome e endereço falsos e, depois de duas entrevistas, fingindo ter sotaque da região, conseguiu convencer os funcionários a lhe dar lugar para dormir, com café da manhã, e passagens de ônibus. Tudo de graça.