Título: Venda de lotes revolta condomínios
Autor: Rosane Garcia
Fonte: Jornal do Brasil, 06/01/2006, Brasília, p. D6

Os líderes do Movimento Popular em Defesa dos Condomínios, que representam cerca de 250 mil moradores, foram surpreendidos e estão indignados com a decisão do governo do Distrito Federal de licitar 32 lotes desocupados no Setor Habitacional Jardim Botânico. Quarta-feira, à noite, cerca de 500 pessoas participaram de um encontro para definir o conjunto de ações que será realizado na tentativa de suspender a venda dos imóveis, marcada para o dia 10. Amanhã será dia de vestir roupas e portar bandeiras pretas, e queimar pneus, a partir das 9h, diante do Centro Comercial, em frente à Escola de Administração Fazendária e dar vazão a toda a indignação, a fim de chamar a atenção das autoridades do DF para o inconformismo dos moradores de condomínios. Na terça-feira, a manifestação será em frente à sede da Terracap, ao lado do Palácio do Buriti.

- Estranhamos muito essa decisão do governo. Por várias vezes nos reunimos com o governador Joaquim Roriz. Ele criou um grupo de trabalho para produzir um diagnóstico e definir o caminho para a regularização. Prometeu que ele mesmo presidiria a primeira reunião do grupo e, agora, no final do ano, quando não há um político na cidade, e a maioria das pessoas está de férias, a Terracap anuncia a licitação dos lotes - afirmou Jorge Mattos, do Condomínio Instância Jardim Botânico e um dos três representantes dos moradores no grupo de trabalho, criado pelo governador, em outubro, com a participação das secretarias de Meio Ambiente e Recursos Hídricos, Agricultura, Desenvolvimento Urbano e Habitação, além da Terracap.

Segundo ele, apesar da decisão do governo estar restrita a 32 imóveis, os condôminos foram informados que, no próximo mês, serão colocados à venda os lotes ocupados. Jorge disse que o comprador dos lotes corre o risco de adquirir um bem que não é da Terracap.

- Há 20 anos se arrasta na Justiça uma ação discriminatória sobre a Fazenda Taboquinha, onde estão localizados os lotes colocados à venda, a fim de definir quais terras são particulares e quais são públicas. Até agora, não houve qualquer decisão. A Terracap está colocando à venda algo de que ela não tem certeza se é realmente dona - afirmou Mattos.

Causa ganha - A assessoria da Terracap informou que as pendências judiciais foram resolvidas por decisão do Superior Tribunal de Justiça, que deu ganho de causa à companhia. Hoje, os lotes estão devidamente registrados em nome da Terracap. Rebate também o argumento de que o preço mínimo das parcelas chega, em alguns casos, a três vezes o valor venal do imóvel fixado no carnê do IPTU. De acordo com a assessoria, o preço levou em conta o valor de mercado do imóvel.

Ainda conforme assessoria da Terracap, a área é uma ocupação irregular e quem adquiriu lotes sabia o que estava comprando. Não há outra forma, segundo a companhia, de regularizar o parcelamento a não ser pela venda, por meio de licitação dos imóveis. Trata-se de uma exigência da lei 8.666 (Lei das Licitações). Além disso, há uma determinação do Tribunal de Contas do DF, de 2003, para que a Terracap licitasse as parcelas.

Os atuais ocupantes têm preferência de compra no processo de licitação. Para facilitar a aquisição, a Terracap mudou as regras. Hoje, o interessado pode dar uma entrada de 5% do valor do imóvel e pagar o restante em até 20 anos. Anteriormente, a companhia exigia um sinal correspondente a 10% do valor terreno e o restante era pago em 10 anos.

A assessoria informou ainda que os lotes ocupados também serão colocados à venda por meio de licitação, como ocorreu em outras áreas do DF. A informação reforça a suspeita dos moradores do Jardim Botânico, de que a venda ocorrerá no próximo mês.

- Estão usando as benfeitorias realizadas pelos moradores para valorizar os lotes - afirmou Jorge Mattos, que, como os outros moradores, não se recusa a pagar pelas parcelas que ocupam, mas quer que seja considerado o valor da terra nua, como teria prometido o governador Joaquim Roriz nas reuniões que antecederam à criação do grupo de trabalho.

O anúncio da licitação revoltou Caetano Mafia, que, há dois anos comprou um lote no condomínio Portal do Lago Sul, por R$ 60 mil.

- Estava guardando dinheiro para construir minha casa. Mas essa notícia caiu como uma bomba sobre nossas cabeças - afirmou Caetano.

Ele garante que a área colocada à venda é parte de ação judicial ainda inconclusa.

- Até então, os lotes pertenciam à Fazenda Taboquinha. Da noite para o dia, passaram a fazer parte da Fazenda Papuda. Não sei qual foi a tramóia que eles [Terracap]utilizaram para mudar tudo - disse Caetano.

Ele, como outros moradores, reconhece que compraram os lotes conscientes de que se tratavam de área irregular. Mas tinha a expectativa de que a regularização ocorreria de outra forma.

- Da forma como estão fazendo a operação é extremamente nociva a todas as famílias - afirmou Caetano.