Título: Transparência nas campanhas
Autor: Eduardo Suplicy
Fonte: Jornal do Brasil, 08/01/2006, Outras Opiniões, p. A10

São muito positivas as normas que o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Carlos Velloso, instituirá, em resolução do TSE, para regular as eleições de 2006. Essas diretrizes levam em conta os graves problemas que vieram à luz em 2005 com as denúncias de utilização de recursos não contabilizados para o financiamento de campanhas políticas. Consideram também muito do que já foi objeto de deliberação pelo Senado Federal, ainda não votado pela Câmara dos Deputados.

O TSE e a Receita Federal baixarão atos conjuntos visando um aperfeiçoamento da fiscalização das contas de campanha, permitindo aos auditores fiscalizar eficazmente as tesourarias dos partidos e as empresas com as quais houver relacionamento.

As doações de campanha deverão ser notificadas nas declarações de imposto de renda tanto de pessoas físicas quanto jurídicas. Quem descumprir as normas estará sujeito à auditoria de suas contas pela Receita.

Será criado um novo documento, de preenchimento obrigatório para as empresas que fornecerem materiais de campanha ou prestarem serviços aos candidatos. As informações serão cruzadas pelo fisco com os dados anotados nas prestações de contas pelos partidos ao TSE.

Os comitês deverão manter um Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica CNPJ) próprio e uma conta corrente exclusiva para a movimentação de dinheiro de campanha. Os saques só poderão ser realizados por transferência eletrônica, via Internet, ou através de cheques nominais. Não serão permitidos saques em dinheiro. As contas serão apresentadas ao TSE quinzenalmente. Receitas e despesas serão divulgadas na página do tribunal na internet. Os que não cumprirem as normas terão a conta bancária bloqueada.

As regras valerão para todos os partidos e candidatos nas eleições em 2006, seja para presidente, governador, deputados e senadores. Relembro aqui que em novembro último a bancada de 12 senadores do PT encaminhou ao Diretório Nacional uma proposta de resolução segunda a qual, daqui para a frente, todos nós do PT assumiríamos o compromisso de registrar as receitas, suas respectivas fontes, e despesas de campanha na internet, para permitir à justiça eleitoral e garantir à opinião pública, transparência em tempo real da movimentação de nossas campanhas, assumindo ao mesmo tempo o compromisso firme de não utilização de recursos na forma de caixa dois. O presidente Ricardo Berzoini e o tesoureiro do PT, Paulo Ferreira, informaram que essa proposta será colocada em pauta na próxima reunião do Diretório Nacional.

A questão relevante, em todos os partidos e para cada um dos candidatos, é em que medida será viável o cumprimento dessas normas, sobretudo tendo em conta a prática vigente nas últimas décadas. Note-se que as regras acima listadas levam em conta que não foi aprovada ainda, pelo Congresso Nacional, uma das propostas de reforma eleitoral de que só poderia haver o financiamento público de campanha. Portanto, em 2006, haverá a convivência tanto do financiamento público quanto do privado.

Gostaria de fazer algumas sugestões ao TSE no sentido de que as novas regras possam levar em consideração práticas comuns de levantamento de recursos feitas pelos candidatos nas mais diversas regiões do Brasil. Por exemplo, que tratamento deve ser dado pelo partido ou candidato que promover um café da manhã, almoço ou jantar entre possíveis colaboradores de campanha? Poderá o resultado do evento, receita menos despesas, ser contabilizado como uma contribuição coletiva, ou deverá conter o nome de cada um dos que esteve lá presente? Como fazer se o candidato resolver fazer uma coleta numa assembléia de potenciais simpatizantes, seja numa porta de fábrica, numa escola ou faculdade, num auditório ou em qualquer reunião? Deverá a contribuição de todos ser identificada? Até mesmo se for bem modesta? Que tratamento dar à eventual venda de materiais de campanha, símbolos do partido ou do candidato? Como deverão agir os partidos e candidatos nas regiões do Brasil onde ainda não existe o telefone e a possibilidade da utilização da internet?

São problemas práticos que a Justiça eleitoral, em diálogo com os partidos políticos, poderá resolver utilizando o bom senso. Ainda há poucos dias, quando comentava essas questões com um dos mais ilustres companheiros do PT, ele observou: ''Mas, Eduardo, você se lembra que no começo da história do PT nós determinamos que todo candidato tinha que colocar no seu material de campanha também o nome do partido e dos candidatos majoritários, e que nem todos cumpriam. Será que agora todos vão cumprir essa diretriz? E se alguém oferecer um montante em dinheiro para o candidato, sem registro?'' Creio que vai depender muito da firme determinação da sociedade e de cada um de nós, candidatos, colocarmos em prática os novos princípios e procedimentos.