Título: Nem nos Estados Unidos é assim
Autor: Sergio Duran
Fonte: Jornal do Brasil, 09/01/2006, País, p. A3

O parlamentar brasileiro ganha mais com salários e mordomias do que os congressistas americanos. Apenas em salário, um deputado federal brasileiro ganha 26 mil dólares (R$ 55 mil) a mais que um colega de ofício nos EUA durante o ano. Somando as verbas recebidas durante a convocação extraordinária, os vencimentos anuais de um parlamentar correspondem a aproximadamente 188 mil dólares (R$ 413 mil). O congressista americano, embora trabalhe mais, recebe cerca de 162 mil dólares (R$ 356.400) por ano, sem direito a benefícios como auxílio-moradia e viagens, ambos pagos do próprio bolso.

Os gastos dos parlamentares chamam a atenção durante a convocação extraordinária de dois meses do Congresso, que custará aos cofres públicos quase R$ 100 milhões e vem sendo considerada uma folga remunerada - os trabalhos das Comissões de Ética e as votações só terão início no próximo dia 16. Os ganhos anuais dos deputados foram calculados com os salários recebidos mensalmente, incorporados dois salários do chamado auxílio-paletó (um salário no início da legislatura e um no final), o décimo-terceiro salário e os vencimentos de R$ 25.694 da renda extra paga durante a convocação. Foram somados ainda os R$ 15 mil reais mensais da chamada verba indenizatória do exercício parlamentar, com uso mediante a apresentação de notas fiscais. Entretanto, são notas com gastos como combustível, entre outros, não fiscalizadas pela Casa e que a direção da Câmara nunca permitiu a imprensa o acesso a estes comprovantes.

A organização do Congresso americano é semelhante ao brasileiro em sua estrutura, embora as regalias não se apresentem como as mesmas. O Capitólio, na capital americana de Washington, abriga o Senado composto por 100 integrantes e a Casa dos Representantes - similar a nossa Câmara dos Deputados - com 435 representantes. Segundo o cientista político Geraldo Monteiro, as duas casas legislativas são instituições autônomas.

- Existe entre elas uma equiparação constitucional, uma não é superior à outra, além da repartição de competências entre elas e matérias de voto comum, como o Orçamento. Também existem nos Estados Unidos Comissões Permanentes e Comissões Provisórias, como as nossas CPIs.

Enquanto os deputados brasileiros têm direito a receber, mensalmente, auxílio-moradia no valor de R$ 3 mil e quatro passagens aéreas (Brasília/capital do Estado/Brasília), o político americano é obrigado a pagar do próprio bolso seu aluguel e passagens quando viaja a seu estado de origem.

Lá também não se folga tanto como aqui. Enquanto os deputados brasileiros têm direito a 90 dias de recesso, no parlamento americano a interrupção não ultrapassa 45 dias. A convocação extraordinária também faz jus ao nome. É rara. Nenhuma foi realizada no últimos anos. Enquanto isso no Brasil, desde promulgada a Constituição de 1988, há 18 anos, já foram feitas 18 convocações. Apenas em quatro desses anos - 1989, 1990, 1994 e 2002 - o Legislativo não foi convocado nenhuma vez. Nos demais foram realizadas convocações, por vezes, mais de uma no mesmo ano.

Segundo o cientista político americano, naturalizado brasileiro, David Fleischer, da Universidade Nacional de Brasília, também há no Congresso dos EUA o instrumento de convocação extraordinária, mas usado apenas em casos de emergência e não remunerado.

- Por essas convocação não está previsto pagamento em nenhuma hipótese. É possível uma convocação quando houver um assunto muito importante para decidir, geralmente quando não é feita a aprovação do orçamento, mas é raro. No Brasil a convocação foi mal feita. Todos sabiam que o trabalho seria interrompido. Não vejo razão para a convocação, a não ser que sirva para fazer caixa para as campanhas políticas deste ano - avaliou Fleischer.

Outra diferença é que ao longo de toda a história americana apenas 5 membros representantes foram expulsos do Congresso. No Brasil, só em 2005 foram três. Os políticos de Washington também não têm direito à imunidade parlamentar. Em 2002, James Trafficant, acusado de corrupção, foi julgado por um juiz federal em 1ª instância e preso, o que acarretou sua cassação.