Título: De olho no seu voto
Autor: Hugo Marques
Fonte: Jornal do Brasil, 07/01/2006, País, p. A3
As garrafas que animaram o revéillon de Brasília enfeitam as margens de um dos lagos do Congresso Nacional. Em 22 dias de uma convocação extraordinária que vai custar R$ 100 milhões ao bolso do contribuinte, Câmara e Senado são, para os turistas, a imagem do descaso. Dos 513 deputados que estão recebendo salários em dobro, 416 não apareceram para trabalhar nesta semana. - A impressão é de abandono. Não vi nenhum político - lamenta a turista Rafaela Brum. Gaúcha, 23 anos. Ela só não ficou mais assustada com o abandono do Congresso durante a convocação extraordinária porque trabalha como assessora parlamentar na Liderança do PMDB, na Assembléia Legislativa de Porto Alegre (RS).
Na entrada do Congresso, na chapelaria, os turistas encontram um monte de terra, entulho e uma rampa improvisada de madeirite, que cobre obras no piso. Há também obras de correção do teto de gesso e até para dragar o lago que, segundo os técnicos, joga água suja na Esplanada quando chove muito.
Virado para a Praça dos Três Poderes, o lago está com a água pela metade e acumula no fundo copos de plástico, jornais velhos e até anúncio de cursinho. Em volta de um dos lagos da frente do Congresso, o turista se depara com uma grama que vira mato.
Dentro do Congresso, quase ninguém trabalhando. As vagas da garagem dos presidentes da Câmara, Aldo Rebelo, e do Senado, Renan Calheiros , estão vazias. Os gabinetes também. Alguns funcionários de plantão usam o sistema de som da Câmara para ouvir um rock no último volume. A chuva da sexta-feira deu um ar ainda mais fúnebre aos coloridos salões vazios do Congresso.
A Câmara desligou o detector de metais da entrada das comissões. Os técnicos aproveitaram o dia calmo para consertar o raio X dos fundos do prédio do Anexo IV. Na entrada da chapelaria, o segurança Telmo não se importa em fazer retornar as pessoas quando soa o alarme do detector de metais.
- Não se preocupa não, pode entrar - diz Telmo.
Os 16 plenários de comissões - onde os parlamentares deliberam antes das votações - estão com as luzes desligadas e as portas de vidro preto trancadas.
Pelo menos no Senado, a imagem é de um Severino atuante. Um dos telões do corredor que dá acesso aos gabinetes dos senadores exibe os discursos do ex-presidente da Câmara.