Título: Erro de avaliação piora dengue
Autor: Waleska Borges
Fonte: Jornal do Brasil, 16/01/2006, Rio, p. A14
Possível quarta vítima fatal da doença no Rio foi atendida em hospital público e mandada de volta para casa sem tratamento Com fortes dores no abdômen, febre alta, machas vermelhas pelo corpo e vômitos, sintomas semelhantes ao de dengue hemorrágica, o adolescente Renan da Silva Arnesino, 15 anos, procurou atendimento no Hospital Estadual Rocha Faria, em Campo Grande. Depois do diagnóstico de que poderia ser uma virose, ele foi dispensado. Alguns dias depois, ainda mais doente, o adolescente foi levado para uma clínica particular. Sem dinheiro para pagar o tratamento, a família retornou com Renan para o Rocha Faria. Menos de oito horas depois da internação, na madrugada da quinta-feira passada, Renan morreu no mesmo hospital que o dispensara anteriormente. Ele pode ter sido a quarta vítima da dengue no Estado do Rio. A causa da morte do adolescente não consta no atestado de óbito. Segundo o pedreiro Damião Pedro Arnesino, pai de Renan, os médicos chegaram a desconfiar de hepatite e leptospirose. Abalado, Damião conta que o filho começou a passar mal uma semana antes de morrer.
- Na primeira vez em que fomos ao Rocha Faria, mandaram que o meu filho ficasse em casa de repouso. Receitaram apenas dipirona - lembra Damião, que depois de ver o filho piorar o levou para uma clínica particular.
Na clínica, segundo Damião, ele foi alertado por uma médica de que o filho estava grave e deveria ser internado. A mesma médica, conforme conta Damião, recomendou que o adolescente voltasse para o Rocha Faria porque a família não poderia pagar pelo tratamento particular. De volta ao hospital estadual, o rapaz foi internado na enfermaria da emergência. Segundo Damião, não havia vaga no CTI. No soro, o adolescente era observado pelo pai e um enfermeiro.
- Ele teve uma convulsão. O médico demorou a chegar e quando o levaram para sala de de reanimação o aparelho estava quebrado. Por uma fresta na porta, vi quando os médicos faziam massagem no seu peito com as mãos - emociona-se o pai.
O rapaz foi enterrado na última sexta-feira. Segundo Damião, ele autorizou autópsia para descobrir a causa da morte. De acordo com Damião, os médicos não comentaram com a família nenhuma suspeita de dengue. Depois de saber das notícias sobre outras mortes por dengue, no Rio, a família resolveu pedir ajuda ao vereador Carlos Eduardo de Mattos (PPS), vice-presidente da Comissão de Saúde da Câmara dos Vereadores.
- Nada vai trazer meu filho de volta, queremos apenas esclarecer qual foi a causa da sua morte. Se realmente foi por dengue, precisamos evitar que outras pessoas fiquem doentes - desaba Damião, que tem outros dois filhos de 13 e 18 anos.
Estudante do ensino médio, o adolescente tinha uma vida saudável e fazia exercícios regularmente. Segundo seu pai, a doença e o mal estar foram repentinos.
- Ele gostava de empinar pipa e tinha vários sonhos - conta o pai.
Segundo o diretor do Hospital Rocha Faria, Alberto Domingos Leite Souza, não houve tempo suficiente para se fazer com precisão o diagnóstico da doença.
- O diagnóstico da dengue não se faz de imediato. Assim como a virose, não há remédio específico e o tratamento é sintomático - explica Souza.
O entomologista Anthony Érico, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), explica que apesar de sintomas semelhantes, a dengue, hepatite e leptospirose são doenças diferentes. Ele lembra que os casos de dengue são confirmados com o exame laboratorial, mas podem ser identificados na análise clínica.
O diretor do Rocha Faria informou que a causa da morte do adolescente será esclarecida com o resultado da autópsia.
De acordo com Souza, além de avaliar o prontuário do atendimento médico de Renan, ele vai comunicar o caso aos setores de vigilância sanitária municipal e estadual.
- As providências devem ser tomadas antes mesmo que a suspeita de incidência de dengue seja confirmada - assegura o diretor.