Título: Novas estratégias para a batalha
Autor: Claudia Bojunga
Fonte: Jornal do Brasil, 30/01/2006, Ciência, p. A12

Duas pesquisas americanas conseguiram formas de anular a virulência de microorganismos causadores de infecções

Considerado por especialistas um grave problema para a saúde da população mundial, a resistência das bactérias aos antibióticos tem, em dois estudos americanos, seus novos soldados. Os pesquisadores desenvolveram formas para que, no futuro, possam ser produzidos novos medicamentos contra essas infecções, cada vez mais difíceis de serem debeladas.

Os trabalhos têm como estratégia comum se concentrar em anular a virulência do microorganismo, em vez de matá-lo, como faz a maioria dos antibióticos.

A equipe da Universidade de Michigan manipulou o DNA da Escherichia coli - que pode provocar diarréia, infecção urinária entre outras doenças - desativando a camada de lipopolisacarídeos ( formado por lipídios e glicídios) que faz parte da membrana celular. Dessa forma, a bactéria se torna menos virulenta, já que o complexo é responsável pela produção da substância tóxica que ataca o organismo.

A próxima etapa do estudo é, então, encontrar uma substância que bloqueie a função dos lipopolisacarídeos, para que possa ser produzido um antibiótico. Mas Woodard explica que mesmo assim o paciente vai precisar tomar dois remédios.

Apesar de os testes terem demonstrado que a bactéria mutante, em laboratório, se torna menos virulenta, isso não é suficiente para curar a infecção. A vantagem é que com a alteração, o microorganismo passa a ser combatido com um tipo de antibiótico que antes não tinha qualquer efeito sobre ele.

- Conseguimos, assim, aumentar o espectro de ação dos medicamentos já existentes - explica ao JB Ronald Woodard, coordenador da pesquisa e professor de química e medicina da universidade.

O outro estudo, realizado por cientistas da Escola de Medicina de Harvard, descobriu qual enzima deve ser atacada para bloquear a ação ácidos teicóicos, que proporcionam a capacidade da bactéria de se aderir ao hospedeiro, no Staphilococus aureus - que pode provocar desde problemas de pele e até septicemia (infecção generalizada).

A aderência é fundamental, porque só assim a bactéria consegue entrar na célula humana e utilizar suas substâncias para se reproduzir e proliferar pelo corpo.

- Mas se esse processo for impedido, ela não consegue mais infectar o organismo - esclareceu, por telefone, a microbióloga Suzanne Walker que coordenou o trabalho.

A pesquisadora afirmou que escolheu o Staphilococus aureus por ser uma bactéria comum, com a qual qualquer um pode se contaminar.

- Conseguimos, pela primeira vez, observar o comportamento dessas enzimas e identificar qual deve ser inibida. É sempre importante ampliar o número de alvos que novos medicamentos possam atacar - ressaltou Suzanne.

Mas os dois grupos de pesquisadores realçam que os estudos ainda estão em fases iniciais e que pode demorar anos para conseguir fazer uso clínico dos achados.

Enquanto isso, uma maneira de ajudar a combater a resistência de bactéria é evitar o uso indiscriminado de antibióticos.

- Se não, é possível que chegue um momento em que as pessoas não vão ter como tratar determinadas infecções - alerta Marisa Gomes, responsável pela comissão de controle de infecções do hospital Evandro Chagas.

Desde o surgimento dos antibióticos, as bactérias começaram a desenvolver formas de sobreviver ao ataque dos remédios, por exemplo, através de mutações. A situação só tende a piorar, afirmam especialistas