Título: Comendo o mingau pelas beiradas
Autor: Carlos Zarur
Fonte: Jornal do Brasil, 23/01/2006, Economia & Negócios, p. A18

Estados Unidos e Peru concluíram, no final do ano passado, acordo de livre comércio. Mais uma demonstração de que os norte-americanos movimentam-se na direção de acordos bilaterais que venham substituir a Alca, ou, pelo menos, colocá-la em xeque. Em 2004, as exportações de mercadorias dos EUA para o Peru totalizaram US$ 2,1 bilhões. As principais categorias de bens exportados foram maquinário e maquinário elétrico, plásticos, cereais e combustível mineral. As exportações agrícolas americanas para o Peru totalizaram US$ 301 milhões em 2004. Os principais produtos foram trigo, algodão e grãos não refinados. O estoque de investimento estrangeiro direto (IED) no Peru em 2004 foi de US$ 3,9 bilhões. Estes são números importantes que tendem, depois de posto em prática o novo acordo, a aumentar significativamente.

Em meados do ano passado foi anunciado o Cafta, acordo de livre comércio assinado entre os Estados Unidos, América Central e República Dominicana. Fora o velho Nafta, que inclui o Canadá e o México, há, ainda, acordos de livre comércio já fechados com: Austrália, Bahrein, Chile, Cingapura, Marrocos.

Autoridades do governo Bush investem com agressividade para fechar, ainda este ano, acordos de livre comércio com: Colômbia, Emirados Árabes Unidos, Equador, Panamá, Tailândia e cinco nações da União Aduaneira da África Austral.

Como escrevi em artigo publicado no final de agosto do ano passado (Guarda Baixa), é bom o Brasil abrir os olhos e levantar a guarda, pois os Estados Unidos estão comendo o mingau pelas beiradas enquanto patinam as negociações para a instituição da Alca, a Área de Livre Comércio das Américas.

Apesar da posição brasileira em não se alinhar com a política anti-norte-americana do presidente venezuelano, coronel Chávez, e do novo presidente da Bolívia, Ivo Morales; há que se tomar cuidado para não haver um isolamento do país dentro do seu próprio continente. As coisas se complicam ainda mais quando medimos a pressão deste novo Mercosul, com uma Argentina cada vez mais xenófoba ¿ pelo menos em relação ao Brasil ¿ e novos membros como a Venezuela de Chávez.

Espera-se que o Itamaraty sinalize mais claramente qual será a política brasileira diante da evidente agilidade dos Estados Unidos no que diz respeito ao comércio mundial e, particularmente, como vai negociar uma Alca cada vez mais espremida pelos acordos bilaterais de livre comércio fechados pelos norte-americanos com nossos vizinhos.