Título: Chirac alerta para 'novo imperialismo'
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Fonte: Jornal do Brasil, 19/11/2004, Internacional, p. A-7

Em visita a Londres, o presidente francês, Jacques Chirac, advertiu ontem para o risco de se confundir a democratização do mundo, idéia promovida por George Bush, com uma ocidentalização, o que poderia ser percebido como um ''novo imperialismo''.

Em um discurso organizado pelo Instituto Internacional de Estudos Estratégicos em Londres, Chirac propôs mais diálogo entre a Europa e os principais pólos mundiais, entre os quais citou o Brasil, a China e a Índia.

- Embora nossa memória às vezes seja curta, a população submetida à dominação do Ocidente no passado não esquece e está disposta a ver um ressurgimento do imperialismo e do colonialismo em nossos atos - afirmou.

No discurso, o presidente defendeu a necessidade de que Estados Unidos e a Europa trabalhem juntos, mas afirmou que o que pretende é ''uma associação equilibrada'' entre os dois lados do Atlântico.

Mais cedo, em uma entrevista coletiva com o primeiro-ministro britânico, Tony Blair, ambos reafirmaram a estreita amizade entre os países e o desejo de trabalhar juntos no âmbito internacional, embora tenham ressaltado as diferenças sobre a guerra do Iraque.

Blair chegou a dizer que os dois desejam ''um Iraque estável e democrático'', mas as coincidências sobre o país árabe parecem parar por aí. O presidente francês, que se opôs ao conflito, impulsionado por Washington, voltou a insistir que o mundo não está mais seguro depois da intervenção.

- Se observamos a evolução do mundo, levando em conta a segurança e o desenvolvimento do terrorismo, não só no Oriente Médio mas em todo o planeta, não se pode dizer que a situação tenha melhorado - frisou Chirac, lamentando o recente assassinato da refém britânica Margareth Hassan, diretora da organização de caridade Care. - O Iraque é o único ponto em que nós discordamos. Quem está certo ou errado, a história vai dizer - acrescentou.

No entanto, os líderes europeus mostraram sintonia em todos os demais temas debatidos, como o Irã, os Bálcãs, a mudança climática, o desenvolvimento da África e a defesa e a diplomacia européias. Eles defenderam especialmente a reativação do processo de paz no Oriente Médio e se mostraram convencidos de que há possibilidades reais de avanços, diante da convocação de eleições presidenciais palestinas após a morte de Yasser Arafat, no último dia 11, em Paris.

- Há um consenso de que as eleições na Palestina são possíveis e que os palestinos podem expressar sua opinião - disse Chirac.

- Existe um consenso no mundo sobre os objetivos que estamos tentando alcançar [a coexistência de dois Estados]. A boa notícia é que há um acordo sobre o que queremos conseguir. A má é que as partes envolvidas estão muito separadas - afirmou Blair.

Mas, apesar de frisar que a França e a Grã-Bretanha estão preparadas para fazer ''o possível para revitalizar e reativar o processo de paz'' na região, o premier britânico reconheceu o papel decisivo dos Estados Unidos para se alcançar esta meta.

- O fato de que a Grã-Bretanha possa ser um elo entre a União Européia e os EUA é uma vantagem para a Europa - comentou o francês.

Em Ramala, na Cisjordânia, o primeiro-ministro palestino, Ahmed Qorei, anunciou ontem que Nasser el Qedwa, sobrinho de Arafat, receberá da França um relatório contendo as causas de sua morte. O tema é motivo de polêmica entre os palestinos, que até hoje suspeitam que o líder possa ter sido envenenado.