Título: Deputados recebem ''indenização'' sem trabalhar
Autor: Hugo Marques e Mariana Santos
Fonte: Jornal do Brasil, 25/01/2006, País, p. A2

Gastos com combustível e aluguel chegam a R$ 15 mil por cada parlamentar faltoso

BRASÍLIA - A Câmara dos Deputados está ''indenizando'' as despesas de parlamentares que não compareceram a nenhuma das sessões este mês em Brasília. A ''verba indenizatória'' cobre gastos com combustível, aluguel, material de expediente e até ''divulgação de atividade parlamentar'' dos faltosos. No valor de R$ 15 mil, é distribuída todo mês para cobrir despesas complementares dos deputados. Apesar de vários pedidos feitos pelos jornalistas, a direção na Câmara jamais exibiu cópias das notas fiscais referentes às despesas.

Levantamento de presença feito segunda-feira pela Câmara mostra que o deputado Ney Lopes (PFL-RN) não trabalhou em janeiro. O parlamentar, no entanto, será ressarcido em R$ 10,3 mil, onde se incluem R$ 8,3 mil de combustível e gastos com divulgação parlamentar. Ele diz que sofreu cirurgia de hérnia dia 13. Ney não soube detalhar a finalidade dos gastos:

- É uma humilhação eu estar prestando contas, como se eu tivesse praticando algo ilícito. Estou dando explicação como se eu fosse bandido. Deputado é tido como bandido. Não é, até prova em contrário.

A deputada Iriny Lopes (PT-ES) também faltou às sessões em janeiro. Mesmo assim, Iriny registrou R$ 2,9 mil em combustíveis e lubrificantes e material de expediente. Procurada ontem, a deputada afirmou que estava entrando em um consultório e desligou o celular. A assessoria de Iriny informou que ela fez uma ''cirurgiazinha'', mas não detalhou.

O deputado Elimar Máximo Damasceno (Prona-SP) também não aparece na lista de presença de janeiro. Ele está recebendo R$ 12,9 mil de verba indenizatória, onde se incluem gastos de R$ 4,5 mil para divulgação de atividade parlamentar. Elimar afirmou que viajou à Antártida, com autorização da Câmara. Ele acha a indenização normal.

- Todos os parlamentares são assim - afirma Elimar.

O sistema informatizado da Câmara também registra gastos de R$ 4,6 mil do deputado Marcello Siqueira este mês, em que ele não apareceu em Brasília. O deputado diz que foi atropelado em dezembro e que sua licença acaba dia 6. Os gastos de R$ 1 mil em combustíveis, de acordo com Marcello Siqueira, foram de assessores dos escritórios em Minas. Ele demonstrou irritação com as perguntas:

- Você está querendo provar que sou picareta! - reclamou o deputado.

A Câmara também não registrou este mês a presença do primeiro-secretário José Thomaz Nonô (PFL-AL), mas ele pediu indenização de R$ 3 mil de ''locomoção, hospedagem e alimentação''. Segundo sua assessoria, Nonô viajou dia 12 para o Japão, ''com despesas pagas'', para acompanhar as negociações sobre a legislação internacional da despoluição. Até o dia 12 não há registro de sua presença na Câmara.

Entre os parlamentares que apareceram para alguma sessões, os gastos são ainda maiores. O deputado ruralista Abelardo Lupion (PFL-PR) trabalhou quatro dias este mês e apresentou uma conta de R$ 15 mil em combustíveis. A chefe do gabinete do parlamentar, que se identificou como Mercedes, justificou que Lupion prefere viajar de carro para o Paraná. O dinheiro gasto em quatro dias é suficiente para rodar 56 mil quilômetros - mesmo em um carro que só faça 10 quilômetros por litro - mais de 20 viagens de ida e volta entre Brasília e Curitiba.

O deputado Fernando Diniz (PMDB-MG) trabalhou três dias este mês e apresentou uma conta de R$ 15 mil em combustíveis. Uma assessora do parlamentar, que se apresentou como Rita, afirmou que ele e a chefe de gabinete estão viajando e que não os contactaria para falar sobre uma questão que o gabinete não acha importante.

- Só em casos urgentes - justificou a assessora.

O deputado Antônio Cruz (PP-MS) trabalhou quatro dias este mês e apresentou indenização de R$ 14,9 mil em combustíveis. O chefe de gabinete, que se identificou como Francisco, afirmou que o deputado utilizou os combustíveis em ''viagens de campanha pelo Estado'', inclusive para ''cabos eleitorais'', em diferentes carros movidos a álcool, gasolina, diesel. Francisco se recusou a apresentar as notas fiscais.

O deputado Francisco Garcia (PP-AM) pediu indenização de R$ 15 mil em combustíveis para embarcações.