Título: O cavalo arriado
Autor: MAURO SANTAYANA
Fonte: Jornal do Brasil, 25/01/2006, País, p. A2

Não conseguiram, os adeptos da aliança com o PT ainda no primeiro turno, adiar por prazo maior a consulta prévia do PMDB que definirá o candidato do partido às eleições presidenciais. A data será a de 19 de março, dia consagrado a São José, e sempre de grandes cheias. Não foi possível ao grupo governista deter a vontade dos que reclamam, desde 1997, uma candidatura própria. O presidente Fernando Henrique conseguiu impedi-la em seu tempo, apesar dos esforços do então presidente da sigla, Paes de Andrade, que lutou bravamente pela indicação do senhor Itamar Franco. Os que presenciaram a convenção partidária que derrotou o ex-presidente Itamar Franco recordam-se, com horror, do que foi aquele encontro. Arruaceiros contratados a 100 cruzeiros a cabeça, no bas fond de Brasília, auxiliados por policiais militares goianos à paisana, ensangüentaram o Plenário da Câmara, e só o acaso impediu que houvesse morte naquele dia e naquele recinto. Horas depois, Fernando Henrique riu, alegre e feliz, em foto histórica, ao receber os ''vitoriosos'' da baderna.

Foram cenas patéticas. Inferiores em número e em músculos, os militantes do PMDB reagiram como puderam à agressão - mas os governistas de então impediram a candidatura de Itamar. Ainda resta, aos governistas de hoje, o recurso final. Mesmo depois de escolhido o nome do candidato presidencial nas eleições prévias internas, a legislação exige sua aprovação pela Convenção Nacional, mas é quase impossível que ela venha a infirmar a vontade manifesta das bases.

Vamos assistir, nos próximos dois meses, a duelo interno interessante no outrora combativo partido. De um lado - se outros candidatos não surgirem - estará o senhor Germano Rigotto, governador do Rio Grande do Sul e homem afinado com a estrutura partidária. Do outro, o arrivista Anthony Matheus, conhecido como Garotinho, que se apóia na sua condição (também recente) de pastor evangélico radiofônico, para ostentar boa posição nas pesquisas eleitorais. Mas uma coisa é disputar a eleição popular, para a qual Garotinho parece bem situado; outra, concorrer dentro do partido. Não nos parece que o ex-governador do Rio de Janeiro disponha de muito entusiasmo entre os líderes do PMDB. Há, entre eles, o natural preconceito contra os que se utilizam da legenda, sem ter contribuído para a sua construção. São os que montam à sorrelfa, sem ter buscado o cavalo no pasto, nem o ter arriado.

No PSDB inicia-se a luta interna brava, entre Serra e Alckmin. Começam a circular os ataques entre os partidários de uma e outra candidatura, enquanto, como é do rito, os dois trocam amáveis farpas e desbotados sorrisos. Serra deverá enfrentar a memória de sua ação privatizadora, sobretudo na emblemática venda da Vale do Rio Doce, agora contestada por uma sentença judicial. E a Alckmin convém preparar-se. A informação de que seu governo está infiltrado pela Opus Dei, embora não cause prejuízo maior em São Paulo, causará estrago arrasador no resto do país, onde o nacionalismo não foi de todo destruído. A Opus Dei, nascida e nutrida na Espanha franquista, é uma confraria internacional de especialistas laicos, formada para assumir as posições angulares nos meios governamentais e empresariais do mundo. Há, é certo, os que a ela pertencem imbuídos de boas intenções, mas essas boas intenções são domadas pela férrea vontade central de mando.

É dentro desse quadro que o ex-presidente Itamar Franco e o governador Aécio Neves se encontram, hoje, em almoço a dois em Belo Horizonte. Itamar insistirá para que o jovem governador entre na disputa presidencial, e Aécio, pelo que se sabe, prefere esperar mais um pouco. Provavelmente devolverá a homenagem, e estimulará Itamar a disputar as prévias no PMDB. Uma coisa é certa: os dois não estarão separados nos próximos meses. Sobre partidos e nomes, ambos se submetem a razão maior, que lhes é comum: o interesse de Minas. E são os interesses de cada um dos estados, alinhados em alianças suprapartidárias e não só em Minas, que decidirão o pleito.