Título: Matador tenta influenciar a mídia
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 24/01/2006, País, p. A6

Antônio Marcos Pimenta Neves transformou-se numa entidade rara: o jornalista que produz o fato, comunica sua ocorrência à redação, acompanha a cobertura da concorrência e, já na condição de prisioneiro, reivindica o direito de escrever a história. O show de abrangência começou pouco depois do crime, 20 de agosto de 2000. Às 15 horas daquele domingo, o jornalista Cláudio Joaquim Augusto, de 35 anos, chefiava o plantão na redação de O Estado de S. Paulo. Atendeu chamada telefônica sem imaginar que começava a viver a jornada mais surpreendente e dramática da carreira.

¿ Aqui é o Pimenta. Quem fala? Tem alguém na chefia? ¿ perguntou o diretor de redação. Não conseguiu encontrar seu número dois, Lourival Sant¿Anna.

¿ Atirei na Sandra e preciso de ajuda porque quero me entregar ¿ contou. ¿ Estou no celular, mas não adianta ligar. Não vou dizer onde estou. Eu volto a ligar.

Cláudio Augusto ligou para a casa do editor do suplemento agrícola, José Carlos Cafundó de Morais, amigo de Pimenta. Ruy Mesquita, diretor-responsável do jornal foi avisado do que se passava. Em meia hora estavam na redação os principais executivos, que se trancaram numa sala do prédio na Marginal do Tietê, na Zona Norte de São Paulo.

O telefone da sala de reuniões tocou. Cafundó atendeu. Era Pimenta Neves.

¿ É melhor você ir para o seu sítio ou vir para o jornal ¿ aconselhou Cafundó. Alguns minutos mais tarde, outro telefonema. Era Deomar Setti, proprietário do haras em Ibiúna, onde Pimenta guardava o manga-larga Quecé. Cafundó atendeu.

¿ Ela está morta ¿ informou Deomar Setti.

Pimenta telefonou novamente, agora para saber como estava Sandra. Cafundó lhe deu a notícia e perguntou ao chefe onde se encontrava. Pimenta negou a informação. Cafundó contou que Manuel Alceu Affonso Ferreira, advogado da empresa, queria vê-lo. Combinou-se encontro num restaurante na Rodovia dos Bandeirantes.

A seqüência de reuniões no Estadão terminou pouco antes das 20 horas. Ficou decidido que o crime seria resumido numa das seis chamadas secundárias da primeira página: ¿Diretor do Estado é suspeito de assassinato¿, foi o título.

Pimenta não gostou da cobertura do jornal. Queixou-se, por telefone, ao diretor-responsável, Ruy Mesquita.

Disse que considerava o noticiário favorável à família de Sandra. À noite, retomou a queixa numa conversa com o editor-executivo do jornal, José Maria Mayrink.

¿ O noticiário está muito carregado, Mayrink. Está contra mim. Estão ouvindo muito o lado dela. É preciso rever isso. É um absurdo. A Folha de S. Paulo está melhor nesse caso.

Na terça-feira 22 o nome Antonio M. Pimenta Neves migrou definitivamente do expediente de O Estado de S. Paulo, onde figurava como diretor de redação, e passou a freqüentar apenas a seção policial do jornal.

Hoje, Lourival Sant¿Anna e seu ex-chefe, o assassino confesso Pimenta Neves, são investigados pela Polícia Civil por autoria e divulgação de dossiê falsificado com vistas a influir em disputas empresariais. Lourival defendeu Pimenta, dizendo não acreditar que o ex-chefe estivesse envolvido na elaboração do dossiê. O pai de Sandra, João Gomide, discorda.

¿ Não duvido nada que Pimenta esteja envolvido nesse dossiê criminoso.