Título: Tropa da ONU parte para o ataque
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 25/01/2006, Internacional, p. A8

Operação de caça a guerrilheiros que mataram oito capacetes-azuis suscita debate sobre papel da força

GOMA - O caráter humanitário e defensivo das missões de paz das Nações Unidas está sendo subvertido no Congo. Ali, o contingente da ONU enviou um grupo de forças especiais apoiadas por helicópteros de ataque com o objetivo de caçar rebeldes ugandenses que emboscaram os capacetes-azuis, matando oito deles, no entardecer de domingo. A estratégia de confronto marca uma mudança na orientação que suscita debates entre especialistas. Segundo tais avaliações, a missão no país africano estaria empurrando os limites de sua atuação para além do que prevê o mandato - cujos termos são aprovados pelo Conselho de Segurança - e com isso ampliaria o número de baixas no contingente.

O ataque aos soldados guatemaltecos aumentou a decisão da ONU em tomar a ofensiva no Leste da República Democrática do Congo. A região tem sido palco de intensos combates nos quais as tropas do governo vêm sendo sucessivamente batidas.

- Mudamos o caráter da missão de paz aqui. Estamos em um território não demarcado - justifica um oficial, sem se identificar. - A despeito dessas trágicas mortes, a determinação da ONU em tentar resolver a questão permanece - acrescenta.

O Congo, um vasto país do tamanho da Europa Ocidental, enfrenta décadas de ditaduras, guerras e caos. Em dezembro último, o país conduziu um referendo - o primeiro livre e democrático em 40 anos - no qual se aprovou uma nova Constituição. Eleições estavam previstas para este ano, como o passo seguinte do processo de pacificação. Mas a retomada da ação violenta dos rebeldes ao longo do lado Leste e a fraqueza do exército oficial ameaçam o programa.

Há muito também acusada de se omitir diante da situação no país, a maior missão da ONU no mundo iniciou operações para reprimir uma pletora de grupos rebeldes, congoleses, ugandenses e ruandeses. Especialistas militares dizem que as operações só serão eficazes se conseguirem capturar ou matar os líderes das milícias. De outra forma, estas continuarão a se desmobilizar no meio da população, para reagrupar-se e atacar novamente em outro lugar.

- É claro que esse também é um esforço de paz - explica Henri Boshoff, analista do Instituto for Security Studies, em Johanesburgo, África do Sul. - Nos últimos seis meses eles têm lançado várias ações assim. Se não agirem agressivamente, essas pessoas não se desarmarão.

Ao todo, vinte capacetes-azuis já foram mortos em combate no ano passado. Boshoff afirma que o ataque aos guatemaltecos fará com que os países europeus, a quem a ONU vem pedindo reforços para a missão, pensem duas vezes. As tentativas de incorporar ao exército de milhares de guerrilheiros de facções desmanteladas depois do fim oficial do conflito, em 2003, não deram certo. Ao contrário, a guerra hoje atinge seis países. No exército do Congo, apenas 18 brigadas estão organizadas. Dessas, só uma recebeu treinamento formal, mas ainda não tem equipamento, comida e pagamento. Assim, não há disposição para lutar e enfrentar milícias como a de Laurent Nkunda, um general renegado que comanda um bando de ruandeses. Na semana passada, Nkunda caçava, de aldeia em aldeia, os soldados recém incorporados. Em North Kivu, os militares locais foram salvos por um contrataque das tropas indianas da ONU. Assim mesmo, resgatada com helicópteros.

- Reorganizem-se e resistam. Como 300 homens puderam botar 2.300 de vocês para correr? - bradou o general congolês Gabriel Amisi, aos homens que fugiram - Esses rebeldes por acaso são extraterrestres? - insistiu.